MINHAS PÁGINAS

  • LEITORES
  • segunda-feira, 25 de abril de 2016

    DESIGUALDADE SOCIAL E REENCARNAÇÃO Jorge Hessen




    Jorge Hessen

    Auroville é uma pequena cidade localizada na Índia. Foi fundada em 1968 pelo casal Sri Aurobindo e Mirra Alfassa. Ali, todos os moradores recebem um salário mínimo e podem trabalhar com o que se adaptem. É uma urbe que não tem políticos ou classes sociais. Não há religião oficial e o dinheiro é de somenos importância. Atualmente, cerca de duas mil pessoas moram na cidade, que tem capacidade de acolher até 50 mil habitantes.

    É uma cidade autossustentável, tem campos cultiváveis, pequenas fábricas, restaurantes, padarias, hospitais, escolas e cinemas, além de um pequeno jornal local, tudo alimentado por energia solar. Não existem prefeito, governador ou secretários. Sempre que surge um problema, uma assembleia é convocada e os cidadãos da comunidade elegem um conselho para solucioná-lo.

    Os habitantes de Auroville são livres para exercer seus rituais e acreditar no que quiserem, desde que não incomodem ou tentem pregar suas crenças aos concidadãos. Para residir na cidade, o interessado precisa comprar uma casa, que custa em média 3 mil dólares. No primeiro ano que passa na cidade, o novato é observado e avaliado pela comunidade. Depois de um ano, período que eles chamam de “estágio”, os cidadãos de Auroville decidem se a pessoa pode ou não permanecer entre eles.

    Observamos ser um lugar apinhado de utopias e talvez não muito encantador, pois com meio século de existência e com capacidade para receber até 50 mil moradores, hoje só habitam cerca de duas mil pessoas. Como disse, deve ser um lugar pouco atraente, ou os cidadãos de Auroville devem ser intransigentes (pouco democráticos, diria!). Pode ser que o processo de seleção pela comunidade sobre os que podem ou não residir na cidade (após um ano de “estágio” no local) seja muito rígido ou discriminatório, sabe-se lá!...

    Talvez tenham conquistado em Auroville a virtual igualdade dos “bens”, mas convidamos os leitores a meditarem aqui acerca da teoria da desigualdade das riquezas conforme ensinou Kardec, demonstrando que o princípio da pluralidade das existências pode oferecer a real explicação sobre as dessemelhanças dos “bens” na Terra.

    Sabemos que há “espíritas progressistas”, que apontam Kardec como um ingênuo por ter explanado sobre a desigualdade das riquezas explicando-a sob a lei da reencarnação. Evocam tais “espíritas progressistas” que o proprietário dos meios de produção gera riquezas só para si, enquanto aos que trabalham resta o salário, representando apenas uma parte da riqueza gerada. Creem no lema “de cada qual, segundo sua capacidade; a cada qual, segundo suas necessidades", por isso os “espíritas progressistas” divergem de Kardec, dizendo que o Codificador se equivocou quando afirmou que é um ponto matematicamente demonstrado que a fortuna igualmente repartida daria a cada qual uma parte mínima e insuficiente.

    Kardec assegurou também que se houvesse a repartição dos bens materiais (riqueza), o equilíbrio estaria rompido em pouco tempo, pela diversidade dos caracteres e das aptidões. Tal verdade espírita é intolerável para os “espíritas progressistas”, pois estes defendem a distribuição irrestrita dos bens produzidos pelas empresas a fim de que os proletários possam viver na prerrogativa e violência ideológica do infausto igualitarismo; os “espíritas progressistas” idealizam uma sociedade altruísta (à moda deles), sem valorizar as legítimas conquistas individuais para a boa performance das estruturas sociais.

    Quando Kardec afirmou que se a repartição da riqueza fosse possível e durável, cada um tendo apenas do que viver, e que seria o aniquilamento de todos os grandes trabalhos que concorrem para o progresso e o bem-estar da Humanidade, os “espíritas progressistas” blasonaram que isso representa uma blasfêmia, pois as tecnologias produzidas têm atendido fundamentalmente às necessidades supérfluas da grande massa de consumidores – portanto, pessoas que já possuem o necessário podem utilizar a sua riqueza para o consumo do supérfluo.

    Gritam furiosamente os tais “espíritas progressistas”, levantando por que supor que Deus é o agente da concentração de riquezas? Bradam, então, que a riqueza concentra-se pelo simples fato de que quem já possui fortuna tem mais chances de vencer num mercado competitivo, e assim acumular mais riqueza num movimento crescente de concentração de capital. Como se observa uma, dedução horizontalizada, superficial, mecanicista e nada razoável dos “insurgentes progressistas”, que insistem em dizer que isso não significa que devamos “ler a realidade” como um “plano de Deus”.

    Creem os “progressistas” que a riqueza pode e deve ser concentrada sob a propriedade coletiva (sic), visando exclusivamente o benefício geral da humanidade, não permitindo a desigualdade de riqueza, pois assim toda a sociedade acaba “refém” da decisão do endinheirado de bem ou mal utilizar a riqueza. Além do quê, a sua apropriação fica sendo necessariamente injusta, já que os trabalhadores que recebem salário como remuneração pela venda de sua força de trabalho não ganham integralmente por toda a riqueza por eles produzida.

    Expõem ainda os “progressistas” que em dez anos, no Brasil, as desordens distributivas estão na ordem do dia, pois os ricos se tornaram mais ricos, os pobres se tornaram menos pobres e uma certa classe média tradicional viu sua posição relativa em relação a essas duas outras camadas prejudicada. A classe média perdeu status. Os ricos se distanciaram e os pobres se aproximaram, daí o conflito atual. Que saibam utilizar a inteligência a fim de entenderem que “as classes [sociais] existiram e existirão sempre, o que porém deve preocupar, e é racional estabelecer a solidariedade entre elas, a conciliação de seus interesses, a multiplicação urgente das leis de assistência social, únicas alavancas mantenedoras da ordem.''[1]

    É bem verdade que a desigualdade social ou econômica é um problema presente em todos os países (ricos ou pobres), decorrente da má distribuição de renda e, ademais, pela falta de investimento na área social. Compreendemos que uma repartição mais equitativa dos “bens” é imprescindível. Há “trocentas” teorias sociológicas, mil sistemas diferentes, tendendo a reformar a situação das classes desprovidas, a assegurar a cada um, pelo menos, o estritamente necessário. Ótimo!

    Mas, infelizmente, noutro cenário, ao invés da recíproca tolerância que deveria aproximar os homens, a fim de lhes permitir estudar em conjunto e resolver os mais graves problemas sociais, tem sido com violência e atualmente no Brasil com ameaça na boca (verbal e saliva hostil ou “cuspidela”) que o militante reivindica seu lugar na ágape social. Outrossim, é uma lástima ver o endinheirado aguilhoado no seu egoísmo e recusando a ofertar aos famintos as menores migalhas da sua fortuna. Dessa forma, um muro tem separado ambos, e os quiproquós, as selvagerias, as cupidezes, as animosidades, os desrespeitos acumulam-se dia a dia.

    Politicamente sabemos que as leis elaboradas pelos legisladores podem, de momento, modificar o exterior, mas não logram mudar a intimidade do coração humano; daí vem serem os decretos de duração efêmera e quase sempre seguidos de uma reação mais depravada. A origem do mal reside no egoísmo e no orgulho. Os abusos de toda espécie cessarão quando os homens se regerem pela lei da caridade.

    Para confirmar as magníficas teses de Kardec sobre o assunto, reflitamos com Emmanuel: “A desigualdade social é o mais elevado testemunho da verdade da reencarnação, mediante a qual cada espírito tem sua posição definida de regeneração e resgate. Nesse caso, consideramos que a pobreza, a miséria, a guerra, a ignorância, como outras calamidades coletivas, são enfermidades do organismo social, devido à situação de prova da quase generalidade dos seus membros. Cessada a causa patogênica com a iluminação espiritual de todos em Jesus-Cristo, a moléstia coletiva estará eliminada dos ambientes humanos”.[2]

    Referências bibliográficas:

    [1] Xavier Francisco Cândido. Palavras do infinito, III parte, ditado pelo Espírito Emmanuel, SP: Ed. LAKE, 1936

    [2] Xavier , Francisco Cândido. O Consolador, pergunta 55, ditado pelo Espírito Emmanuel, RJ: Ed. FEB, 1978

    domingo, 24 de abril de 2016

    ROUSTAING - O SESQUICENTENÁRIO TÃO AGUARDADO NA FEB (Jorge Hessen)




    Jorge Hessen

    Um confrade muito querido sugeriu-me escrever sobre a revista Reformador, estabelecendo um paralelo entre a elevação dos conteúdos doutrinários veiculados no passado remoto , e a atual insipidez doutrinária e excesso de fotografias de dirigentes publicadas nas suas páginas.

    Outro companheiro informou-me que a FEB – Federação Espírita Brasileira está preparando o lançamento (previsto para o mês de junho de 2016) da nova edição dos “Quatro Evangelhos”, almejando a submissão comemorativa aos 150 anos de lançamento do livro de J.B. Roustaing. Desta forma , telefonei para o departamento editorial da FEB e foi confirmado o tal lançamento, por isso mesmo,  deliberei antecipar um manifesto de alerta em face da augurada reedição das obras que representam a ruptura de união ente os espíritas no Brasil.

    Percorrendo determinadas narrativas sobre a história da revista Reformador inteiramo-nos de que ela foi fundada em 21/1/1883 por Augusto Elias da Silva, um fotógrafo português, num corajoso empreendimento de difusão espírita no Brasil do século XIX. Isto porque, fundar e conservar um órgão de propaganda espírita, na Corte do Brasil era, naquele período, para esmorecer o ânimo dos espíritas mais resolutos. Uma vez que dos púlpitos brasileiros, principalmente dos da Capital, choviam anátemas sobre os espíritas, os novos hereges que cumpria abater.

    Escreveu o fotógrafo lusitano o seguinte: "Abre caminho, saudando os homens do presente que também o foram do passado e ainda hão de ser os do futuro, mais um batalhador da paz: o "Reformador". Com essas palavras inaugurais apresentava-se, no Brasil o novo órgão da divulgação espírita. ”[1]

     O artigo de fundo do primeiro número traçava as diretrizes de paz e progresso pelos quais se nortearia o informativo, definindo ainda os objetivos que tinha em vista alcançar. Apresentou-se, portanto, o "Reformador" como mais um semeador da paz, apetrechado da tolerância e da fraternidade, desfraldando a bandeira da presumível “união” entre os espíritas. Ótimo!

     Até 1888 a redação do periódico funcionou (no ateliê) montado na residência do Elias da Silva. Era um jornal quinzenal composto de quatro páginas e estima-se que sua tiragem inicial era de aproximadamente 300 exemplares, contando com cerca de uma centena de assinantes. A partir de 1902 passou ao formato de revista, inicialmente com 20 páginas e periodicidade bimestral. Na década de 1930 passou a ser mensal, e o número de páginas aumentou gradativamente. Em 1939, a FEB adquiriu e instalou as máquinas impressoras próprias, nas dependências dos fundos do prédio da Avenida Passos. Foi uma decisiva empreitada e graças a essa providência, as edições e reedições de livros espíritas e da revista começaram sua expansão.

     Em seguida, com a instalação do complexo gráfico, em 1948, em amplo edifício (atualmente abandonado, arrasado e falido) especialmente construído em São Cristóvão/Rio de Janeiro, a FEB acresceu a propaganda doutrinária. Paradoxalmente, na década de 1970 a FEB “modernizou” as impressões de Reformador com as capas coloridas, substituindo inclusive o logotipo e desenho, mas a Revista tomou novo rumo gráfico oferecendo gigantescos espaços de proeminência para as imodestas imagens (fotos) dos diretores febianos.

     Apesar de ser um dos quatro periódicos surgidos no Rio de Janeiro, de 1808 a 1889, que sobreviveram até os dias atuais e o único que nunca teve interrompida sua publicação, todavia diversas vezes desviou-se do programa de estudar, difundir e propagar a legítima Doutrina dos Espíritos sob o seu tríplice aspecto (científico-filosófico-religioso), sobretudo durante a coordenação do editor Luciano dos Anjos.

    Em verdade, tudo tem matrizes nos eternos diretores roustanguistas que ininterruptamente (há mais de 100 anos) se revezam na direção da FEB até os dias atuais. Nesse confuso cenário foram infligidos e cedidos espaços fadigosos do periódico a fim de veicular as burlescas teses da metempsicose consubstanciada nos “criptógamos carnudos” (involução), do neo-docetismo [2] consoante propostos nas obras do visionário J.B. Roustaing, um “após(tolo)” da discórdia! 


    Nos capítulos 14 e 15 de  "A Gênese" Allan Kardec aniquila as teses do enfadonho livro de Roustaing. E mais , na Revista Espírita, Junho de 1868 – Os Evangelhos Explicados. […] Kardec  escreve: “O autor [Roustaing] desta nova obra julgou dever seguir um outro caminho. Em vez de proceder por gradação, quis atingir o fim de um salto. Assim, tratou certas questões que não tínhamos julgado oportuno abordar ainda e das quais, por consequência, lhe deixamos a responsabilidade, como aos espíritos que as comentaram
    Convém, pois, considerar essas explicações como opiniões pessoais dos espíritos que as formularam, opiniões que podem ser justas ou falsas e que, em todo o caso, necessitam da sanção do controle universal, e, até mais ampla confirmação, não poderiam ser consideradas como partes integrantes da Doutrina Espírita."

    Se fossem mais prudentes reprovariam o que Roustaing , afirma na sua ÚNICA obra literária (Os Quatros Evangelhos) , no    III Volume  , na pág. 65 e 66 dizendo que “A  Igreja católica  terá a sua verdadeira significação, pois que ela estará em via de tornar-se universal, como sendo a Igreja do Cristo, o chefe da Igreja católica, dizemos, será um dos principais pilares do edifício. Quando o virdes, cheio de humildade, cingido de uma corda e trazendo na mão o cajado do viajante, podereis dizer: “Começam a despontar os rebentos da figueira; vem próximo o estio“. E pelo que sei, desde a primeira edição já são mais de 15 milhões de exemplares publicados pela FEB citando tais sandices..

     A trajetória centenária do Reformador se confunde com a própria história do quartel-general de J.B.Roustaing, a FEB, da qual tem sido a porta-voz e a representação do seu pensamento. Confrades que não rezam pela cartilha roustanguista, embora sejam coordenadores de uma ou outra área doutrinária da FEB (baixo clero), jamais alcançaram lograr maiores destaques administrativos, sendo “aceitos” de esguelha pelos poderosos diretores (alto clero) , todos fanáticos pelo advogado de Bordeaux.

     A revista Reformador, não raro, expressou várias vezes uma linha editorial e diretrizes a serviço do Evangelho à maneira sorrateira dos fastidiosos volumes dos “Quatro Evangelhos” de Roustaing, tal como ocorreu na presidência do Armando de Assis. Destaque-se que os quatro volumes de Roustaing são estudados sistematicamente nas reuniões públicas realizadas todas as terças feiras na sede da FEB, em Brasília e na sucursal febiana, sediada na Av. Passos-Rio de Janeiro, e isto diz tudo.

     A FEB e UNICAMENTE ELA sucessivamente esteve na dianteira em defesa do roustanguismo. Nessa linha de contra-senso, tem expressado sempre a prevalência das suas verdades docetistas, embaralhadas e camuflada atrás da boa literatura do Chico Xavier e dos clássicos que edita. A FEB acredita que conseguirá catalisar a “unificação” e a unidade da Doutrina; mas em realidade , sempre sucederam e sobrevirão as dissidências (internas e externas) resultantes dos sofismas de princípios insustentáveis pela racionalidade kardeciana.

     Para a consubstanciação do projeto da disseminação do docetismo, há mais de um século a FEB vem catequisando à socapa alguns confrades ingênuos. Na volúpia insuperável das interpretações equivocadas dos eternos fascinados pelos “Quatro evangelhos” vai transformando o caleidoscópico Movimento Espírita Brasileiro numa desordem ideológica sem precedentes inspirados nos vaporosos pilares dos engodos dos Quatro Evangelhos.

     Com Roustaing narcotizando a mente do alto clero febiano será empreita impraticável evitar a dispersão sistemática e generalizada cada vez mais acentuada dos espíritas, em caminho de desintegração, por força de interferências obsessivas em nível de fascinação. Se a unidade doutrinária foi a única e derradeira divisa de Allan Kardec para o fortalecimento do Espiritismo, a união deve ser a fortaleza inexpugnável da Doutrina Espírita. Em verdade a FEB não conseguiu avançar coisa nenhuma nesse quesito de união entre os espíritas, justamente por que se deixou abater diante dos embustes docetistas, e de outras aberrações doutrinárias contidas na obra do bordelense, razão suficiente para não lograr a unificação, pois desconhece o poderoso antídoto contra os venenos das discórdias e desuniões, a coerência legada pelas obras codificadas por Allan Kardec.

     Herculano Pires na sua sapiência ponderava: “Em os Quatro Evangelhos as verdades são sempre contrariadas pelas mentiras, o natural é prejudicado pelo absurdo e o belo é sempre desfigurado pelo horrível. Jesus é fluidificado, purificado e até endeusado; mas também é ironizado, ridicularizado, deturpado e estupidificado”! “Roustaing é o anti-Kardec. Se Kardec é o bom senso, Roustaing é a falta de bom senso”. [3]

     Queira Deus que no futuro não distante ressurja o ideário da concepção e fundação de uma CONFEDERAÇÃO ESPÍRITA no Brasil (sem Roustaing, óbvio!)

    Referências:

    [1] disponível em http://febnet.org.br/site/conheca.php?SecPad=3&Sec=188 acesso em 13/04/2016

    [2] Os gnósticos-docetas do primeiro século sustentavam que Jesus não tinha realidade física, que o seu corpo era apenas aparente. Sua posição contrariava as teses da encarnação do Cristo, apresentando-o como uma espécie de Deus mitológico, sob a influência das idéias helenísticas. O Docetismo exerceu grande influência em Alexandria, propagando-se a Éfeso, onde o apóstolo João instalara a sua Escola Cristã. João refutou a tese doceta como herética, pois além de não corresponder à realidade histórica, transformava o Cristo num falsário. A fábula dos docetas ( como o apóstolo Paulo a classificou) apresentava-se como uma das mais estranhas desfigurações do Cristo, fornecendo elementos ricos e valiosos aos mitólogos para negarem a existência real e histórica de Jesus de Nazaré.

    [3] Pires, Herculano. O Verbo e a Carne, São Paulo: Ed Paideia, 1972

    sexta-feira, 22 de abril de 2016

    “NASCER, MORRER, RENASCER...” ADOLESCÊNCIA E SUICÍDIO - Jorge Hessen


    Jorge Hessen

    A juventude é uma grande fase de descobertas, de experiência de novas emoções e sensações. É compreensível, neste período de transição entre os estágios infantil e adulto, que o vendaval dos mais diversos anseios e pensamentos se torne presente na mente do jovem, erguendo opiniões, preconceitos, tabus e outros temas que eram tidos como certos e inalteráveis. A estrada sedimentada com a presença dos pais até então vai se dissipando sob seus passos, estabelecendo que ele, depressa, construa os alicerces do seu próprio caminho.

    Nesse contexto de deliberação e meditação, o jovem ingênuo ou o adolescente imaturo, que jamais teve um calçamento firme e estruturado por onde pudesse caminhar se desorienta e busca, em atitudes extremas, debelar sua perturbação e tédio com o mundo. Diante do desafio de viver com as diferenças, pode brotar então a conduta suicida, que se consubstancia através de acenos psicológicos aos ensaios para a morte.

    A depressão é, seguramente, o diagnóstico psiquiátrico mais notado em jovens que tentam o autoextermínio. Desfalecimento, consumo de drogas, desarmonia no lar, desordens de conduta, fatos estressantes, violências físicas, sexuais ou psicológicas e causas fisiológicas podem ser avaliados como os fundamentais agentes geradores desse distúrbio. Mesmo com o avanço significativo da ciência médica, algumas manifestações permanecem obscuras no campo da psicologia. A mente humana guarda mistérios ainda não desvendados.

    Quase sempre o jovem que pensa em suicídio dá sinal dessa ideia através de um comportamento diferente no seu modo de viver, passando a buscar refúgio na solidão, isolando-se de tudo e de todos. A maioria das tentativas e das realizações de suicídio entre jovens acontece sobretudo em lares desarmonizados, com famílias desestruturadas, ou procedentes de grupos familiares que apresentam herança de enfermidades somáticas e/ou mentais. Os atos dos jovens buscando a auto eliminação podem ser formas desesperadas de pedir carinho, de chamar a atenção para si. Desse modo, a função da família deve funcionar como decidido antídoto contra o suicídio.

    O autocídio é transgressão às leis de Deus, considerado dos mais graves que o ser humano pratica ante o seu Criador. Muitas são as consequências para os que atentam contra a própria vida; são, porém, variáveis para cada espírito, pois há de se levar em conta os pretextos da opção pelo autoextermínio e as formas empregadas para praticá-lo.

    Os espíritos de suicidas são enfáticos e unânimes em declarar a intensidade dos sofrimentos que experimentam, a agonia da situação em que se abalam, decorrentes do seu impensado gesto. Como atitude de suprema rebeldia ante o Criador, ainda que com atenuantes ou agravantes, nenhum suicida se liberará do resultado sinistro da ação que praticou em face da desobediência às leis da Criação, e fatalmente uma nova reencarnação o esperará, seguramente em condições mais problemáticas do que aquela em que destruiu a si mesmo.

    O suicídio é circundado de complexos e sutilezas imprevisíveis, cercado por circunstâncias e consequências gravíssimas, embora possam variar de grau e intensidade diante das ocorrências. As leis de Deus são incorruptíveis e ajuizadas, solicitando de cada um de nós o máximo bom senso para analisá-las e aprendê-las sem decompô-las através de nossos desejos e paixões.

    Sob o ponto de vista espírita, recordamos que a obsessão espiritual igualmente se constitui numa das causas de jovens matarem-se. Quase sempre a perseguição espiritual exprime a desforra que um espírito exerce e que, com obstinação, se enraíza nas relações que o obsidiado manteve com o obsessor em vidas pregressas. Portanto, a ideia recorrente de autocídio, que vez por outra surge na mente de muitos jovens, pode ser reflexo de experiências de encarnações antecedentes.

    No debate, garantimos que o Espiritismo é um dos maiores preservativos contra o suicídio. Quando o jovem consegue assimilar as lições dos Bons Espíritos, o suicídio deixa de fazer sentido para ele, mormente quando o adolescente reflete de forma madura a máxima “Nascer, morrer, renascer ainda, progredir sem cessar, tal é a lei”. Sim! O moço perceberá que está diante de um Código Divino que encerra a transcendência da vida, sendo, portanto, o maior defensivo contra o suicídio.

    sábado, 16 de abril de 2016

    ROUSTAING - O SESQUICENTENÁRIO TÃO AGUARDADO NA FEB (Jorge Hessen)





    Jorge Hessen

    Um confrade muito querido sugeriu-me escrever sobre a revista Reformador, estabelecendo um paralelo entre a elevação dos conteúdos doutrinários veiculados no passado remoto , e a atual insipidez doutrinária e excesso de fotografias de dirigentes publicadas nas suas páginas.

    Outro companheiro informou-me que a FEB – Federação Espírita Brasileira está preparando o lançamento (previsto para o mês de junho de 2016) da nova edição dos “Quatro Evangelhos”, almejando a submissão comemorativa aos 150 anos de lançamento do livro de J.B. Roustaing. Desta forma , telefonei para o departamento editorial da FEB e foi confirmado o tal lançamento, por isso mesmo,  deliberei antecipar um manifesto de alerta em face da augurada reedição das obras que representam a ruptura de união ente os espíritas no Brasil.

    Percorrendo determinadas narrativas sobre a história da revista Reformador inteiramo-nos de que ela foi fundada em 21/1/1883 por Augusto Elias da Silva, um fotógrafo português, num corajoso empreendimento de difusão espírita no Brasil do século XIX. Isto porque, fundar e conservar um órgão de propaganda espírita, na Corte do Brasil era, naquele período, para esmorecer o ânimo dos espíritas mais resolutos. Uma vez que dos púlpitos brasileiros, principalmente dos da Capital, choviam anátemas sobre os espíritas, os novos hereges que cumpria abater.

    Escreveu o fotógrafo lusitano o seguinte: "Abre caminho, saudando os homens do presente que também o foram do passado e ainda hão de ser os do futuro, mais um batalhador da paz: o "Reformador". Com essas palavras inaugurais apresentava-se, no Brasil o novo órgão da divulgação espírita. ”[1]

     O artigo de fundo do primeiro número traçava as diretrizes de paz e progresso pelos quais se nortearia o informativo, definindo ainda os objetivos que tinha em vista alcançar. Apresentou-se, portanto, o "Reformador" como mais um semeador da paz, apetrechado da tolerância e da fraternidade, desfraldando a bandeira da presumível “união” entre os espíritas. Ótimo!

     Até 1888 a redação do periódico funcionou (no ateliê) montado na residência do Elias da Silva. Era um jornal quinzenal composto de quatro páginas e estima-se que sua tiragem inicial era de aproximadamente 300 exemplares, contando com cerca de uma centena de assinantes. A partir de 1902 passou ao formato de revista, inicialmente com 20 páginas e periodicidade bimestral. Na década de 1930 passou a ser mensal, e o número de páginas aumentou gradativamente. Em 1939, a FEB adquiriu e instalou as máquinas impressoras próprias, nas dependências dos fundos do prédio da Avenida Passos. Foi uma decisiva empreitada e graças a essa providência, as edições e reedições de livros espíritas e da revista começaram sua expansão.

     Em seguida, com a instalação do complexo gráfico, em 1948, em amplo edifício (atualmente abandonado, arrasado e falido) especialmente construído em São Cristóvão/Rio de Janeiro, a FEB acresceu a propaganda doutrinária. Paradoxalmente, na década de 1970 a FEB “modernizou” as impressões de Reformador com as capas coloridas, substituindo inclusive o logotipo e desenho, mas a Revista tomou novo rumo gráfico oferecendo gigantescos espaços de proeminência para as imodestas imagens (fotos) dos diretores febianos.

     Apesar de ser um dos quatro periódicos surgidos no Rio de Janeiro, de 1808 a 1889, que sobreviveram até os dias atuais e o único que nunca teve interrompida sua publicação, todavia diversas vezes desviou-se do programa de estudar, difundir e propagar a legítima Doutrina dos Espíritos sob o seu tríplice aspecto (científico-filosófico-religioso), sobretudo durante a coordenação do editor Luciano dos Anjos.

    Em verdade, tudo tem matrizes nos eternos diretores roustanguistas que ininterruptamente (há mais de 100 anos) se revezam na direção da FEB até os dias atuais. Nesse confuso cenário foram infligidos e cedidos espaços fadigosos do periódico a fim de veicular as burlescas teses da metempsicose consubstanciada nos “criptógamos carnudos” (involução), do neo-docetismo [2] consoante propostos nas obras do visionário J.B. Roustaing, um “após(tolo)” da discórdia! E pelo que sei, desde a primeira edição já são mais de 15 milhões de exemplares publicados pela FEB.

     A trajetória centenária do Reformador se confunde com a própria história do quartel-general de J.B.Roustaing, a FEB, da qual tem sido a porta-voz e a representação do seu pensamento. Confrades que não rezam pela cartilha roustanguista, embora sejam coordenadores de uma ou outra área doutrinária da FEB (baixo clero), jamais alcançaram lograr maiores destaques administrativos, sendo “aceitos” de esguelha pelos poderosos diretores (alto clero) , todos fanáticos pelo advogado de Bordeaux.

     A revista Reformador, não raro, expressou várias vezes uma linha editorial e diretrizes a serviço do Evangelho à maneira sorrateira dos fastidiosos volumes dos “Quatro Evangelhos” de Roustaing, tal como ocorreu na presidência do Armando de Assis. Destaque-se que os quatro volumes de Roustaing são estudados sistematicamente nas reuniões públicas realizadas todas as terças feiras na sede da FEB, em Brasília e na sucursal febiana, sediada na Av. Passos-Rio de Janeiro, e isto diz tudo.

     A FEB e UNICAMENTE ELA sucessivamente esteve na dianteira em defesa do roustanguismo. Nessa linha de contra-senso, tem expressado sempre a prevalência das suas verdades docetistas, embaralhadas e camuflada atrás da boa literatura do Chico Xavier e dos clássicos que edita. A FEB acredita que conseguirá catalisar a “unificação” e a unidade da Doutrina; mas em realidade , sempre sucederam e sobrevirão as dissidências (internas e externas) resultantes dos sofismas de princípios insustentáveis pela racionalidade kardeciana.

     Para a consubstanciação do projeto da disseminação do docetismo, há mais de um século a FEB vem catequisando à socapa alguns confrades ingênuos. Na volúpia insuperável das interpretações equivocadas dos eternos fascinados pelos “Quatro evangelhos” vai transformando o caleidoscópico Movimento Espírita Brasileiro numa desordem ideológica sem precedentes inspirados nos vaporosos pilares dos engodos dos Quatro Evangelhos.

     Com Roustaing narcotizando a mente do alto clero febiano será empreita impraticável evitar a dispersão sistemática e generalizada cada vez mais acentuada dos espíritas, em caminho de desintegração, por força de interferências obsessivas em nível de fascinação. Se a unidade doutrinária foi a única e derradeira divisa de Allan Kardec para o fortalecimento do Espiritismo, a união deve ser a fortaleza inexpugnável da Doutrina Espírita. Em verdade a FEB não conseguiu avançar coisa nenhuma nesse quesito de união entre os espíritas, justamente por que se deixou abater diante dos embustes docetistas, e de outras aberrações doutrinárias contidas na obra do bordelense, razão suficiente para não lograr a unificação, pois desconhece o poderoso antídoto contra os venenos das discórdias e desuniões, a coerência legada pelas obras codificadas por Allan Kardec.

     Herculano Pires na sua sapiência ponderava: “Em os Quatro Evangelhos as verdades são sempre contrariadas pelas mentiras, o natural é prejudicado pelo absurdo e o belo é sempre desfigurado pelo horrível. Jesus é fluidificado, purificado e até endeusado; mas também é ironizado, ridicularizado, deturpado e estupidificado”! “Roustaing é o anti-Kardec. Se Kardec é o bom senso, Roustaing é a falta de bom senso”. [3]

     Queira Deus que no futuro não distante ressurja o ideário da concepção e fundação de uma CONFEDERAÇÃO ESPÍRITA no Brasil (sem Roustaing, óbvio!)

    Referências:

    [1] disponível em http://febnet.org.br/site/conheca.php?SecPad=3&Sec=188 acesso em 13/04/2016

    [2] Os gnósticos-docetas do primeiro século sustentavam que Jesus não tinha realidade física, que o seu corpo era apenas aparente. Sua posição contrariava as teses da encarnação do Cristo, apresentando-o como uma espécie de Deus mitológico, sob a influência das idéias helenísticas. O Docetismo exerceu grande influência em Alexandria, propagando-se a Éfeso, onde o apóstolo João instalara a sua Escola Cristã. João refutou a tese doceta como herética, pois além de não corresponder à realidade histórica, transformava o Cristo num falsário. A fábula dos docetas ( como o apóstolo Paulo a classificou) apresentava-se como uma das mais estranhas desfigurações do Cristo, fornecendo elementos ricos e valiosos aos mitólogos para negarem a existência real e histórica de Jesus de Nazaré.

    [3] Pires, Herculano. O Verbo e a Carne, São Paulo: Ed Paideia, 1972

    terça-feira, 12 de abril de 2016

    O CRISTÃO NÃO SE ATEMORIZA ANTE OS DESAFIOS DA VIDA (Jorge Hessen)




    Jorge Hessen

    Uma situação de crise econômica e agravamento da insegurança, como nos dias de hoje, alteram as relações sociais, sobretudo no trabalho. Há nessa conjuntura uma relação entre o social e o trabalho, e o sujeito na organização será afetado por isso, aumentando seu medo e sofrimento. O maior temor de quem tem emprego hoje é perdê-lo. A demissão é traumática, sem dúvida. O modelo de relação de trabalho atual é cruel. O sujeito que, dentro da organização, assiste a diversas demissões, vê vários de seus colegas serem "despedidos", e que tem medo de ser a próxima vítima, sabe que a falta de proteção é uma das causas dos seus medos e angústias.

    Vivemos e continuamos a viver numa sociedade atemorizada. O medo é um sentimento proveniente da incerteza diante dos desafios da vida. A sociedade promete demasiadamente ao indivíduo, entretanto não lhe proporciona segurança e vende ilusões sorrateiras. A tecnologia materialista impele o homem a desejar ter cada vez mais, a consumir e adquirir bens materiais, esquecendo-se dos bens verdadeiros - os bens espirituais (que coincidentemente algumas “religiões” comercializam sem nenhum pudor).

    Urge reagir a esta perspectiva de obter, de adquirir. Porém, há os que desejam competir e temem fracassar. Vários deixam-se abater ante as extravagâncias de comportamento, dos gastos excessivos e do exibicionismo, esperando vencer a consternação do medo. Os desprevenidos descambam para a delinquência e para as devassidões. Procuram possuir (sem poder) o que a sociedade oferece, sendo possuídos pela posse, gerando uma onda de violência urbana e de vícios pervertidos. O excesso da vida automatizada provocou carência de solidariedade humana, originando uma avalanche de incertezas e desconfianças.

    O medo pode ser decorrente de grande choque moral nas profundezas do ser, como intenções maquiavélicas ou infidelidades conjugais. Tudo isso suscita a contemporânea consciência de culpa e os enigmas de relacionamento. O receio de encarar os seus problemas e resolvê-los arremessa as pessoas a conectarem-se com outras mentes desencarnadas em desalinho que lhes inspiram e sugerem a fuga através das drogas, da bebida, do cigarro, do apelo erótico exagerado.

    Irrompe-se o temor de não se sentir parte do grupo dos "vitoriosos", conduzindo os medrosos a chamar a atenção para si através do comportamento excêntrico, uso excessivo de tatuagens e de trajes espalhafatosos. E o patético da síndrome do medo é quando alguém não se sente amado e busca desenfreadamente o amor a qualquer preço, em qualquer lugar. Como não consegue distinguir o legítimo amor, busca o abominável escambo (troca) de parceiros, a compensação dos desejos, aportando facilmente na licenciosidade, na prostituição escamoteada.

    Confiemos plenamente na Inteligência Suprema que providencialmente administra a vida, sabendo que Ele, a Causa primeira de todas as coisas, é Soberanamente Bom e Justo, e que nos seus estatutos não há espaços para injustiças. Certamente, agindo assim, ao olharmos para trás, teremos uma percepção diferente dos fatos que nos aconteceram e perceberemos que todas as experiências, boas ou más, cooperaram para o nosso bem, mediante as quais o ser progride sempre!


    Através do trabalho solidário e fraternal, aprendemos a entender as dores e angústias dos nossos companheiros, a ter compaixão, e finalmente a amar verdadeiramente. O triunfo é sobre nós mesmos, e para consegui-lo é preciso lutar. Portanto, oremos e peçamos orientação de Jesus; deixemos os receios e expulsemos o medo, para que possamos viver e agir com dignidade.

    sexta-feira, 8 de abril de 2016

    OS DONS DA “BRUXARIA” (MEDIUNIDADE!) Jorge Hessen



    Jorge Hessen



    Uma menina de seis anos, que sofria de albinismo, foi encontrada morta e com seus membros cortados no Burundi , na África. Eis aí um caso de assassinato, segundo autoridade policial local, motivado por rituais de feitiçaria. Acredita-se que os órgãos das pessoas com essa desordem genética são usados para fazer poções mágicas, a fim de garantir a juventude, a riqueza e o poder às pessoas que nela creem. Estamos diante da condição, extremamente, primitiva do ser humano que cultua tais crenças.

    Anja Ringgren Lovén, ativista dinamarquesa, foi a responsável por salvar Hope, um garotinho africano da Nigéria de dois anos que foi abandonado pela família sob o estigma de ser a encarnação de um “bruxo” (médium!). Depois de passar oito meses morando na rua, Hope foi resgatado por Ringgren e, aos poucos, recuperou-se de um avançado estado de desnutrição. A dinamarquesa fez um magnífico serviço de socorro, sem dúvida, mas analisemos a questão pelo ponto de vista do sortilégio tão temido por diversas família africanas.

    Na Idade Média, eram santos e santas, quando se afinavam à cartilha religiosa da época, ou então, feiticeiros e bruxas, recomendados à fogueira ou à forca, quando se não ajustavam aos preconceitos do tempo em que nasceram. O Papa João XXII, em 1326, autorizou a perseguição às bruxas sob o disfarce de heresia. O Concílio de Basileia (1431-1449) apelava à supressão de todos os males que pareciam arruinar a Igreja. Em 1484 o Papa Inocêncio VIII promulgou a bula Summis desiderantes affectibus, confirmando a existência da bruxaria. No mesmo ano foi lançado o livro Malleus Maleficarum, pelos inquisidores Heinrich Kraemer e James Sprenger. Com 28 edições, esse volumoso manual se tornou uma espécie de bíblia da caça às bruxas. Contudo, Benedict Capzov, um fanático luterano, foi responsável pela morte de aproximadamente 20.000 "bruxas", apoiando-se na “lei” do Êxodo (22,18); “Não deixarás viver a feiticeira”.

    No Brasil, no mês de outubro de 1890, foi promulgado o Código Penal da República, que, maliciosamente, associa a prática do Espiritismo aos rituais de magia e adivinhações. O texto dizia o seguinte, no Artigo 157: "É crime praticar o Espiritismo, a magia e seus sortilégios, usar de talismãs e cartomancia (...), inculcar curas de moléstias (...) e subjugar a credulidade pública. Pena: prisão celular de 1 a 6 meses e multa de 100 a 500 $;. Os espíritas reclamaram com Campos Sales, Ministro da Justiça da época, mas nada adiantou. O relator do Código, João Batista Pinheiro, limitou-se a dizer que o texto se referia à prática do "baixo" Espiritismo, como se existissem dois Espiritismos. 

    Na verdade, os republicanos utilizaram os espíritas como bodes expiatórios para diminuir a oposição católica ao novo regime, causada pelo desatrelamento entre a Igreja e o Estado. Como consequência do Código, vários companheiros foram presos em 1891, no Rio de Janeiro. Preocupado com possíveis focos de resistência ao regime, o Governo autorizou a polícia a invadir reuniões e residências à procura de opositores. Para evitar confusões, muitos centros decidiram fechar, temporariamente.

    Paulo de Tarso escreveu aos coríntios, “Acerca dos dons espirituais, não quero, irmãos, que sejais ignorantes. Vós bem sabeis que éreis gentios, levados aos ídolos mudos, conforme éreis guiados. Portanto, vos quero fazer compreender que ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz: Jesus é anátema, e ninguém pode dizer que Jesus é o Senhor senão pelo Espírito Santo. 

    Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. E há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. E há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos. Mas a manifestação do Espírito é dada a cada um, para o que for útil. Porque a um pelo Espírito é dada a palavra da sabedoria; e a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra da ciência; e a outro, a fé; e a outro, os dons de curar; e a outro a operação de maravilhas; e a outro a profecia; e a outro o dom de discernir os Espíritos; e a outro a variedade de línguas; e a outro, a interpretação das línguas.” [1]

    Atualmente há médiuns tido como (“bruxos”!) de todos os matizes, em largas expressões, a saber: psicógrafos, clarividentes, clariaudientes, curadores, poliglotas, psicofônicos, materializadores, intuitivos etc. Paulo de Tarso foi admirável médium de clarividência e clariaudiência, às portas de Damasco, ao ensejo de seu encontro pessoal com Jesus. Todavia, não podemos esquecer que os subjugados – os doentes mentais e os obsedados de todos os graus – que enxameavam a estrada dos tempos apostólicos, eram também médiuns (“bruxos”!).

    Referência:
    [1]           I Cor., 12:1 a 11

    quinta-feira, 7 de abril de 2016

    MEDITAÇÃO, EDUCAÇÃO E LABOR (Jorge Hessen)


    Jorge Hessen

    Ao orarmos, penetramos de alguma forma no universo da meditação. Com o exercício disciplinado dos pensamentos, podemos chegar aos melhores resultados de uma prece. Contudo, o domínio dos pensamentos, considerando a cultura ocidental, é de terrível dificuldade. Quase sempre nós ocidentais construímos pensamentos repletos de ideias vagas, ingênuas, sensuais, arremessamos censuras, mantemos anseios utilitaristas, entulhamos as descargas neurológicas que geram amplo consumo de energia física e mental. Certamente a concentração (meditação) no ambiente adequado pode aliviar a tensão emocional e patrocinar um nível de estabilização e alívio psíquico que tende a refletir no bem-estar físico e espiritual.

    Atraiu-nos a atenção a programação do Centro de Educação Infantil Lar de Crianças Ananda Marga, creche municipal localizada no bairro Jardim Peri Alto, na zona norte de São Paulo, administrada pela ONG Amurt-Amurtel, adotando uma linha pedagógica neo-humanista, que estimula o aluno a sentir-se como integrante da natureza que o acolhe. Oferece aulas de yoga e meditação às cerca de 110 crianças matriculadas nessa instituição. Todos os alunos entre zero e três anos de idade realizam prática de relaxamento e massagem. Até os bebês do berçário passam pela técnica.

    A proposta é sedutora, pois cremos que uma legítima educação é aquela em que os poderes espirituais regem a vida social. Por outro lado, recordo que no meu tempo de criança, a pureza delas era uma realidade mensurável. A perspectiva da criança não ultrapassava os simples livros didáticos, um único humilde caderno e brinquedos baratos. Para repreendê-las e educá-las, às vezes bastava um olhar firme dos pais. Porém, aquele imaginário infantil, de quietude e sonho ingênuo, desmoronou sob o impacto da era do sensualismo, da violência, do materialismo.

    Todo processo de educação constitui-se na base da formação de uma sociedade saudável. A tarefa que nos cumpre realizar é a da educação das crianças pelo exemplo de total dignificação moral. Nesse sentido, os postulados Espíritas são antídotos contra todos os venenosos ardis humanos, visto que aqueles que os conhecem têm consciência de que não poderão se eximir das suas responsabilidades sociais, sabendo que o futuro é uma decorrência do presente. Deste modo, é urgente identificarmos no coração infantil o esboço da futura geração saudável.

    Como estamos tratando de educação, evidentemente a educação espírita deve ser mantida restrita aos centros espíritas (para os espíritas), ao lar e, sobretudo, desprovida da roupagem imprópria do sectarismo e do misticismo. O núcleo familiar é o primeiro grupo social do qual participamos e recebemos, não somente herança genética ou de bens materiais, mas principalmente moral. A educação espírita aí tem um papel importantíssimo na formação do caráter do indivíduo, ou melhor, na formação da pessoa como um todo

    No que reporta à prática meditativa de vínculos orientalistas adotada pela creche municipal de São Paulo, esta não contém conexões diretas com as finalidades espíritas. Não constam nos cânones das Obras Básicas as técnicas para meditação e yoga, embora não haja rigorosa incompatibilidade com os princípios doutrinários, até porque todo e qualquer exercício que favoreça o equilíbrio espiritual deve ou pode ser estimulado. Entretanto, não se deve confundir as irradiações mentais através da prece com a meditação mística, mormente aplicada pela yoga. Em razão disso, a Doutrina dos Espíritos recomenda que não se instale nos centros espíritas salas específicas para tais meditações (yoga, relaxamento, defumação com ervas, shantala, massagem indiana etc.).

    Não obstante haja instituições “espíritas” (não deveria haver) que promovem cursos para técnicas de meditação com base na cultura oriental, é necessário ter cuidado para que esses métodos não descaracterizem a proposta espíritas, até porque as crenças vinculadas às práticas de meditações místicas têm suas próprias instituições, destinadas aos seus adeptos, e certamente nada impede que os “espíritas” ajustados com essas propostas busquem os núcleos não espíritas adequados e aí meditem quando, como e quanto desejarem.

    Finalmente, meditar é importante, sem sombra de dúvida, desde que não neutralize nossos afazeres do ganha pão, neutralizem nossos braços e mãos, nem nos faça abdicar dos convites dos Benfeitores Espirituais, uma vez que eles apontam a rota segura de uma meditação produtiva, que não nos hipnotiza com técnicas que centram atenções quase sempre exclusivas em nós mesmos. Não podemos esquecer que Jesus nos conclamou a amar o próximo como a nós mesmos e não o oposto, ou seja, todo o amor, júbilo, contentamento que ansiamos para nós, devemos em condição de equidade ao nosso próximo.

    segunda-feira, 4 de abril de 2016

    O ORADOR SOB A RIBALTA DOS PALCOS ESPÍRITAS (Jorge Hessen)



    Jorge Hessen

    Aflige-nos saber que palestrantes espíritas oferecem insistentemente os seus nomes aos escaladores dos centros espíritas visando realizar palestras nas instituições doutrinárias existentes neste País. Alguns carregam a agenda na mão e praticamente compelem a designação do retorno. Inclusive a que realize palestras nas comunidades espíritas de outros países. Tais confrades “oferecidos” esquecem que, em nome de Jesus, toda palestra deve ser uma ferramenta sublime de disseminação do amor e da humildade e jamais de autopromoção. 

    O palestrante precisa fugir dos holofotes e de qualquer propósito de destaque pessoal, necessita “silenciar exibições de conhecimentos, usar simplicidade, evitar alarde, sensacionalismo. ” [1]Todas as temáticas doutrinárias poderão malograr, caso o palestrante não se esforce humildemente para praticar o que prega.

    O orador precisa falar sem dramaticidade, sem afetação, sem arrogância, sem empáfia, sem ostentação, pois, do contrário, o público mudará a atitude receptiva inicial e tornar-se-á refratário e até hostil ao final da palestra. Por essa razão, é crucial falar sem imitação de gestos, voz, fraseado ou o estilo normalmente “divaldista”, mostrando-se simples e atencioso, vibrando simpatia e benevolência.

    Aos palestrantes, candidatos ao estrelismo, importa que não “decorem simplesmente” quaisquer textos de livros espíritas para recitá-los, quais palradores, pois a expressão maquinal não agrada a quem ouve e, sobretudo, a Deus. Os espíritos nos recomendam nas palestras o “governo das próprias emoções, sem azedume, sem nervosismo e sem momices”[2].

    Há palestrantes que são abusivamente "satíricos" (visando fazer gargalhar os ouvintes na platéia), outros não conseguem despir-se das ostentações, santificações, endeusamentos e euforia proselitista. Alguns “deuses da tribuna” forçam palavras “mansas, melosas, piegas” que chegam a ficar pálidos em face do hercúleo esforço para demonstrar mansidão, outros carregam um eterno sorriso com dentes trincados (pressionando com força os de baixo com os de cima) na tentativa de demonstrar simpatia forçada. Centro espirita não é circo, por isso tais atitudes precisam ser evitadas urgente.

    Infelizmente, no insofreável desejo de chamar a atenção alheia, muitos oradores querem ser aplaudidos e venerados perante os outros. Há oradores que fazem palestras nos centros espíritas, congressos, seminários e outros “encontrões”, que veneram espalhar autógrafos, Cd’s das suas palestas, locupletando-se de ovações que às vezes têm conferido auréola de quase oráculos sagrados. Infelizmente tais arremedos de “deuses” da tribuna vão se iludindo, criando a efígie de intocáveis, "emissários da tranquilidade", "embaixadores do bem". Não será impossível alguns centros “espíritas” edificarem altares em suas homenagens em futuro próximo.

    Muitos palestrantes ficam submissos às imposições sociais quando buscam adesão (bajulações) dos outros, “quando permanecem na posição de permanentes escravos e pedintes do aplauso hipócrita e do verniz, da lisonja, condicionando-os a viver sem usufruir de liberdade de consciência, submetendo-os a ser manipulados pelos juízos e opiniões alheias.” [3]

    O orador deve reagir com todas as suas forças contra os “confetes” e lisonjas, para que a vaidade não lhe venha toldar o raciocínio e o próprio campo de ação, e mais ainda, nunca deve julgar-se indispensável ou excepcional, criando exigências ou solicitando considerações especiais por que se considera um escolhido dos deuses para divulgar o Espiritismo.

    Referências bibliográficas:

    [1] Vieira, Waldo. Conduta Espírita, Ditado pelo Espírito André Luiz, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1991, Na Propaganda
    [2] ______, Waldo. Conduta Espírita, Ditado pelo Espírito André Luiz, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1991, Na Tribuna
    [3] Xavier, Francisco Cândido. Saudação do Natal – Mensagem “Trilogia da vida”, ditado pelo espírito Cornélio Pires , SP: Editora CEU, 1996

    O ORADOR SOB A RIBALTA DOS PALCOS ESPÍRITAS (Jorge Hessen)

    Jorge Hessen

    Aflige-nos saber que palestrantes espíritas oferecem insistentemente os seus nomes aos escaladores dos centros espiritas visando realizar palestras nas instituições doutrinárias existentes neste País. Tais confrades “oferecidos” esquecem que, em nome de Jesus, toda palestra deve ser uma ferramenta sublime de disseminação do amor e da humildade e jamais de autopromoção. 

    O palestrante precisa fugir dos holofotes e de qualquer propósito de destaque pessoal, necessita “silenciar exibições de conhecimentos, usar simplicidade, evitar alarde, sensacionalismo. ” [1]Todas as temáticas doutrinárias poderão malograr, caso o palestrante não se esforce humildemente para praticar o que prega.

    O orador precisa falar sem dramaticidade, sem afetação, sem arrogância, sem empáfia, sem ostentação, pois, do contrário, o público mudará a atitude receptiva inicial e tornar-se-á refratário e até hostil ao final da palestra. Por essa razão, é crucial falar sem imitação de gestos, voz, fraseado ou o estilo normalmente “divaldista”, mostrando-se simples e atencioso, vibrando simpatia e benevolência.

    Aos palestrantes, candidatos ao estrelismo, importa que não “decorem simplesmente” quaisquer textos de livros espíritas para recitá-los, quais palradores, pois a expressão maquinal não agrada a quem ouve e, sobretudo, a Deus. Os espíritos nos recomendam nas palestras o “governo das próprias emoções, sem azedume, sem nervosismo e sem momices”[2].

    Há palestrantes que são abusivamente "satíricos" (visando fazer gargalhar os ouvintes na platéia), outros não conseguem despir-se das ostentações, santificações, endeusamentos e euforia proselitista. Alguns “deuses da tribuna” forçam palavras “mansas, melosas, piegas” que chegam a ficar pálidos em face do hercúleo esforço para demonstrar mansidão, outros carregam um eterno sorriso com dentes trincados (pressionando com força os de baixo com os de cima) na tentativa de demonstrar simpatia forçada. Centro espirita não é circo, por isso tais atitudes precisam ser evitadas urgente.

    Infelizmente, no insofreável desejo de chamar a atenção alheia, muitos oradores querem ser aplaudidos e venerados perante os outros. Há oradores que fazem palestras nos centros espíritas, congressos, seminários e outros “encontrões”, que veneram espalhar autógrafos, Cd’s das suas palestas, locupletando-se de ovações que às vezes têm conferido auréola de quase oráculos sagrados. Infelizmente tais arremedos de “deuses” da tribuna vão se iludindo, criando a efígie de intocáveis, "emissários da tranquilidade", "embaixadores do bem". Não será impossível alguns centros “espíritas” edificarem altares em suas homenagens em futuro próximo.

    Muitos palestrantes ficam submissos às imposições sociais quando buscam adesão (bajulações) dos outros, “quando permanecem na posição de permanentes escravos e pedintes do aplauso hipócrita e do verniz, da lisonja, condicionando-os a viver sem usufruir de liberdade de consciência, submetendo-os a ser manipulados pelos juízos e opiniões alheias.” [3]

    O orador deve reagir com todas as suas forças contra os “confetes” e lisonjas, para que a vaidade não lhe venha toldar o raciocínio e o próprio campo de ação, e mais ainda, nunca deve julgar-se indispensável ou excepcional, criando exigências ou solicitando considerações especiais por que se considera um escolhido dos deuses para divulgar o Espiritismo.


    Referências bibliográficas:

    [1] Vieira, Waldo. Conduta Espírita, Ditado pelo Espírito André Luiz, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1991, Na Propaganda

    [2] ______, Waldo. Conduta Espírita, Ditado pelo Espírito André Luiz, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1991, Na Tribuna

    [3] Xavier, Francisco Cândido. Saudação do Natal – Mensagem “Trilogia da vida”, ditado pelo espírito Cornélio Pires , SP: Editora CEU, 1996

    DESMISTIFICANDO O PRECONCEITO DO ESPÍRITA EM RELAÇÃO À UMBANDA


    Leonardo Paixão (*)


    Temos acompanhado artigos e textos os mais diversos, assim como vídeos na Internet, a respeito da Umbanda e de um preconceito que existiria dos espíritas em relação aos umbandistas.

    Há textos e vídeos muito esclarecedores, como os do confrade Pedro Camilo, biógrafo de Yvonne Pereira e do confrade Jorge Hessen, assim como vídeos deste.

    Para nosso estudo precisaremos colocar um resumo da história da fundação da religião de Umbanda.

    No dia 15 de novembro do ano 1908, o médium Zélio Fernandino de Mores, recebeu na Federação Espírita de Niteroi, RJ, o “Caboclo das Sete Encruzilhadas”, onde este manifestado no médium leva o médium para o lado de fora e retira um flor e a coloca sobre a mesa. Médiuns videntes teriam visto os espíritos de ex-escravos (pretos-velhos) e índios (caboclos) no ambiente. Disse o “Caboclo das Sete Encruzilhas”, segundo os Umbandistas um pseudônimo do Padre Gabriel Malagrida:

    ““(...)se julgam atrasados os espíritos de pretos e índios, devo dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho (Zélio), para dar início a um culto em que estes pretos e índios poderão dar sua mensagem e, assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome, que seja Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminhos fechados para mim.”(1)

    Realmente, no outro dia, o ‘Caboclo das Sete Encruzilhadas” se manifestou na casa do médium Zélio Fernandino de Moraes e estabeleceu as normas dos trabalhos:

    - Sessões, assim seriam chamados os períodos de trabalho espiritual, diárias, das 20:00 às 22:00 h;
    - os participantes estariam uniformizados de branco e o atendimento seria gratuito.
    - Deu, também, o nome do Movimento Religioso que se iniciava: UMBANDA – Manifestação do Espírito para a Caridade.

    “Nesse mesmo dia incorporou um preto velho chamado Pai Antônio, aquele que, com fala mansa, foi confundido como loucura de seu aparelho e com palavras de muita sabedoria e humildade e com timidez aparente, recusava-se a sentar-se junto com os presentes à mesa dizendo as seguintes palavras:

    "_ Nêgo num senta não meu sinhô, nêgo fica aqui mesmo. Isso é coisa de sinhô branco e nêgo deve arrespeitá."

    Após insistência dos presentes fala:

    "_Num carece preocupá não. Nêgo fica no toco que é lugá di nego."

    Assim, continuou dizendo outras palavras representando a sua humildade. Uma pessoa na reunião pergunta se ele sentia falta de alguma coisa que tinha deixado na terra e ele responde:

    "_Minha caximba. Nêgo qué o pito que deixou no toco. Manda mureque busca."

            Tal afirmativa deixou os presentes perplexos, os quais estavam presenciando a solicitação do primeiro elemento de trabalho para esta religião. Foi Pai Antonio também a primeira entidade a solicitar uma guia, até hoje usadas pelos membros da Tenda e carinhosamente chamada de "Guia de Pai Antonio"”.(1)

    Realizado este pequeno resumo da História da Fundação da religião de Umbanda, analisemos espiriticamente este processo.

    Quando o “Caboclo das Sete Encruzilhadas” diz que se julgavam os espíritos de pretos-velhos e índios como atrasados e que as mensagens que eles traziam eram também boas, por que não disse para os dirigentes e médiuns da referida reunião de que os escutassem e que ele ficaria à disposição para se tirar as dúvidas? Ainda que, no decorrer da reunião ele tenha conversado com uma das médiuns videntes a respeito da figura que ela via nele, a de um Padre e, supostamente, explicasse a maneira de falar. Eis o diálogo:

    Um médium vidente perguntou: - "Por quê o irmão fala nestes termos, pretendendo que a direção aceite a manifestação de espíritos que, pelo grau de cultura que tiveram, quando encarnados, são claramente atrasados? Por quê fala deste modo, se estou vendo que me dirijo neste momento a um jesuíta e a sua veste branca reflete uma aura de luz? E qual o seu nome irmão?

    - "Se querem um nome, que seja este: sou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque para mim, não haverá caminhos fechados."

    - "O que você vê em mim, são restos de uma existência anterior. Fui padre e o meu nome era Gabriel Malagrida. Acusado de bruxaria fui sacrificado na fogueira da Inquisição em Lisboa, no ano de 1761. Mas em minha última existência física, Deus concedeu-me o privilégio de nascer como caboclo brasileiro."(1)

    A resposta do Espírito deixa a desejar – repetimos, estamos falando aqui de uma análise espírita, conforme nos orienta Allan Kardec -, pois, se ele houvera tido uma encarnação como padre jesuíta e sabia bem falar o português, por que ao se manifestar como índio, segundo ele uma encarnação que tivera, não o poderia falar de igual modo, o português e não da forma de um índio ou caboclo, se fazendo até melhor compreendido pelos assistentes? Afinal, nada mais fácil para este espírito o falar em português, usando de médiuns de língua portuguesa!

    Em uma análise espírita, o espírito traz desconhecimento, pois que indica formas, cores de roupa para os médiuns atuarem. Todos os médiuns deviam se uniformizar de branco. Ainda que se diga que o branco simbolize a pureza desejada a ser alcançada pelos médiuns, é bem claro e racional que não se precisa de tais artifícios para se lembrar algo, pois que, com o decorrer do tempo, se torna algo tão mecânico quanto as orações decoradas. É bom sempre repetirmos que estamos fazendo uma análise espírita dos fatos e não dizendo e muito menos impondo que os nossos irmãos umbandistas devam agir de forma diferente. Até porque estamos escrevendo para esclarecimento em nível espírita.

    Em relação à manifestação de Pai Antônio, se identifica no espírito um apego à sua condição de negro que não pode sentar à mesa: - “Nêgo num senta não meu sinhô, nêgo fica aqui mesmo. Isso é coisa de sinhô branco e nêgo deve arrespeitá”. Quanta formalidade desnecessária! Se este espírito tinha uma superioridade espiritual, bastava dizer que os trabalhos se realizam seja em um toco, em uma cadeira, de pé ou sentado à mesa e depois ao ser perguntado se ele sentia falta de alguma coisa, ele responde: - “Minha caximba. Nêgo qué o pito que deixou no toco. Manda mureque busca”. Revelando assim o seu apego às coisas materiais. E há os que mistificam dizendo ser a fumaça do charuto e do cachimbo, elementos para limpeza da aura, para limpeza de fluidos negativos. Se são espíritos de tamanha capacidade espiritual como disse o Caboclo das Sete Encruzilhadas, não se estaria, ao usar destes elementos além de satisfazer as necessidades materiais ainda presentes neles, incentivar o vício nos assistentes? Como orientar a alguém para que procure deixar o vício do fumo com um charuto ou um cachimbo nos lábios?

    Com certeza que os irmãos umbandistas que lerem este artigo haverão de, provavelmente, responder com o que eles têm por fundamentos, de que a roupagem, a forma com que o espírito se apresenta não importa e que estamos a faltar com o respeito por demonstrarmos conhecimento de causa. Respondemos que neste próprio artigo estão as provas de que temos conhecimento de causa e que já visitamos diversos terreiros em nossa cidade de Campos dos Goytacazes, RJ e também em outras cidades do Rio de Janeiro, tendo podido ver de perto no que se transformou a Umbanda – num sincretismo com os diversos cultos africanistas e católicos e, quando se fala que há elementos do espiritismo, erroneamente qualificado por alguns de “kardecismo” (2), estes só o são os estudos dos livros de Kardec ou palestras espíritas realizadas em seus terreiros, palestras que realizamos quando convidados a tal por Pais ou Mães de Santo que atuam em nossa cidade.

    Perguntarão: Um preto-velho ou um caboclo pode ser Guia ou Mentor de uma Instituição Espírita? Respondemos que isso dependerá dos conhecimentos que tais espíritos demonstrarem a respeito do Espiritismo e seu desapego a ritualísticas e elementos materiais. Vale lembrar que o médium Divaldo Pereira Franco, psicografou obra do espírito Manoel Philomeno de Miranda – “Loucura e Obsessão” - editada pela Federação Espírita Brasileira e que mostra Espíritos de alta envergadura como Dr. Bezerra de Menezes e Emerenciana, trabalhando em uma Instituição Umbandista, no entanto, nem Dr. Bezerra e nem Emerenciana, utilizavam-se de elementos materiais em seus trabalhos, apenas orientando (Emerenciana) aos consulentes e Dr. Bezerra atuando especificamente no Plano Astral sem se manifestar em algum médium.

    Vejamos o que disse o médium Chico Xavier quando perguntado sobre a Umbanda no Programa Pinga-Fogo (3) da extinta TV Tupi, no ano de 1971:

    REALI JÚNIOR “Chico, um assunto que não foi ainda abordado no programa hoje. Rapidamente.
    O senhor acha que os Espíritos que se manifestam nos terreiros de umbanda, dizendo-se guias de cura, pretos velhos, índios, caboclos, são Espíritos evoluídos, da luz? Como explica as curas conseguidas por muita gente conhecida, em terreiros? Será que o mal pode apresentar-se através do bem, ou então tomando a sua forma?”

    CHICO XAVIER “Nós respeitamos a religião de umbanda, como devemos respeitar todas as religiões.
    A noite avança e o programa continua e nós estamos preocupados com o tempo que estamos roubando à TV Tupi e aos nossos amigos do auditório. Mas vamos recorrer ao caso das leis cármicas.
    Nos séculos passados, nos três, quatro séculos passados, nós (coletivamente, não estamos falando do ponto de vista individual, mas na condição de brasileiros) buscamos no berço onde nasceram milhões de irmãos nossos reencarnados nas plagas africanas, para que eles servissem às nossas casas e às nossas famílias, instituições, organizações, na condição de alimárias.
    Eles se incorporaram, depois de desencarnados, às nossas famílias. Eles renasceram do nosso próprio sangue, na condição de nossos irmãos, para receberem, de nossa parte, uma compensação, que é a compensação chamada do amor, para que eles sejam devidamente educados ou encaminhados, tanto quanto nós pretendemos educarmos e encaminharmos o progresso.

    Então, temos a religião de umbanda, que vem como uma organização dos Espíritos recentemente, porque quatro séculos é um tempo curto nos caminhos da eternidade, recentemente trazidos para o Brasil, eles organizaram agora, seja numa condição ou noutra. Nós, no Brasil, não conseguimos pensar em termos de cor. Nós todos somos irmãos. De modo que eles organizaram uma religião sumamente respeitada também. Eles também veneram deus, com outros nomes. Veneram os emissários de Deus, com outros nomes. Respeitamos todos e acreditamos que, em toda a parte onde o nome de Deus é pronunciado, o bem pode se fazer. Agora, encontramos na doutrina espírita, individual e coletivamente, em nos referindo aos companheiros da doutrina espírita, a faixa que nos compete no campo de nossa evolução, para estudos do nosso destino, para estudos da imortalidade.

    Quanto a problemas de cura, permitimo-nos lembrar uma coisa: é que às vezes nós pedimos socorro a determinadas organizações, para a cura imediata de determinados impedimentos físicos. Essa cura parece talvez forçada por nossas exigências, porque muitas vezes os nossos irmãos, trazidos das plagas africanas, se habituaram de certo modo a obedecer-nos quase cegamente. Eles se afeiçoam anos com uma afeição terrível do ponto de vista do egoísmo de que nós todos, por enquanto, principalmente em se referindo a mim, somos portadores. Então, exigimos uma cura que se faça de imediato no campo físico, mas nos esquecemos de que às vezes a cura física é um caminho para encontrarmos, mais adiante, desastres morais de consequências imprevisíveis. Então, se as curas demoram no ambiente kardequiano, ou se demoram no campo da medicina, vamos respeitar o problema dessa demora, dessa dilação, porque aquilo se verifica em nosso próprio benefício. Porque muitas vezes uma doença física, ou determinada provação em nossa vida doméstica, nos poupa de acidentes afetivos ou acidentes materiais ou de fenômenos extremamente desagradáveis em nossa vida”.

    Infelizmente, nos dias atuais, temos irmãos espíritas e médiuns que, em suas falas, escritos e psicografias, andam fazendo uma miscelânea de Espiritismo e Umbanda, duas religiões respeitáveis, porém, cada uma com sua estrutura de trabalho e seus fundamentos próprios. Respeito e não preconceito não significam que se “espiritize” a Umbanda e nem que se “umbandize” o Espiritismo (4).

    NOTAS
    (1) De vários sites pesquisados no google – História da Umbanda e também no livro “Fundamentos da Umbanda”, de Ronaldo Linnares e outros.

    (2) O qualificativo kardequiano (ou kardeciano) é, por vezes, um modo de distinguir, de caracterizar os locais onde se pratica e se vivencia a doutrina espírita (denominada por alguns como doutrina kardecista, também para efeito de diferenciação). Não sendo Kardec o criador da doutrina espírita, o uso das palavras kardequianokardecista e kardecismo (este como sinônimo de espiritismo) deve ser evitado porque sugere conceitos equivocados.
    Extraído da nota de número 64 do livro ‘Pinga-Fogo com Chico Xavier”, organizado por Saulo Gomes.

    (3) Pinga-Fogo com Chico Xavier; Saulo Gomes (org.). InterVidas: Catanduva, SP, 2010. pp. 109 a 111. Item Umbanda.

    (4) Ver a nossa crítica analítica de uma destas obras – ww.orientacaoespirita.org/critica_46.html

    (*) Leonardo Paixão é trabalhador espírita em Campos dos Goytacazes, RJ, colaborando com um grupo de amigos de ideal no Grupo Espírita Semeadores da Paz