Luiz Carlos Formiga |
Não podia acontecer.
O que vou fazer? Na tese a pergunta pode ser o mais
importante. Nem sempre os caminhos percorridos oferecem resultados ditos positivos.
Resultados negativos, na maioria das vezes, não são valorizados e socializados
num periódico científico. No entanto os
resultados foram analisados e ofereceram pistas na direção da solução procurada.
Muitas perguntas foram feitas pelo pesquisador, diante da frustração acadêmica.
Na televisão brasileira
havia um humorista que exclamava: “ perguntar não ofende ! ”
Isso me lembra “bancas
de defesa de tese”, das quais participei.
Em casa, eu ia lendo tese
e formulando perguntas. As selecionadas, em razão do tempo, eram colocadas para
o aluno responder na hora.
O critério de seleção das
perguntas era o de me sentir incompetente na resposta. Quando o aluno brilhantemente
respondia eu ficava muito feliz. Eu aprendia um pouco mais. Quando ele se
“embananava” eu ficava feliz também, por ter oferecido uma contribuição para a
linha de pesquisa dele. Por isso, acho também que perguntar não ofende.
Uma professora me pediu
para incentivar alunos. Era uma turma de mestrado em Microbiologia Clínica. O
objetivo era a reflexão em torno do comportamento ético-profissional.
Elaborando o plano de
ensino pensei na estratégia. Foi um desastre, como governos recentes. Nunca
mais fui convidado. Já estou acostumado. Isso acontece frequentemente após
palestras no movimento espírita. As pessoas querem o café quentinho, mas não
querem moer o grão.
A estratégia utilizada
foi inspirada, embora de forma “rudimentar”, por Jung, que invocava a técnica
socrática durante o processo terapêutico. Mas, na Faculdade de Ciências
Médicas, eu não estava diante de pacientes, mas de profissionais comprometidos
com o bom resultado dos exames na Medicina Laboratorial.
Após o aparente
insucesso pedagógico, para não perder o material do conteúdo, tão duramente
pensado, resolvi enviar um texto ao Boletim da Sociedade Brasileira de
Microbiologia. Aí, o resultado foi amplamente satisfatório, pois foi publicado.
Talvez não tenha sido por mérito. O presidente da Sociedade era meu colega de
Departamento e havia sido meu aluno, anos atrás. Como não houve repercussão
creio que tenho uma forte resistência frustração. Seria resiliência?
As perguntas formuladas
no texto, colocadas abaixo, são de fácil solução?
Você é favorável ao aborto no caso de anencéfalos?
E numa gravidez após o estupro?
Devemos distinguir os campos da ética e da
religião? A religião é a expressão das convicções da fé de um grupo humano
restrito? A ética é mais abrangente? A ética avalia os comportamentos do ser
humano enquanto ser humano, independente de qualquer convicção religiosa ou
política? A ética é de ordem qualitativa? A base da legislação para todos os
cidadãos é a ética? Estado é apenas o centro legislador para todos os cidadãos?
O aborto situa-se no campo ético que é
competência do Estado?
O estupro é uma grande injustiça, por ser uma
violação física e moral da dignidade da pessoa?
Se um feto é apenas uma pessoa em potencial,
mas ainda não é uma pessoa, podemos recomendar o aborto?
Um adulto sem potencial, paciente terminal, não
é mais uma pessoa? Podemos pensar na eutanásia?
Os espíritas advogam que são inúmeras as
evidências científicas sugestivas de imortalidade e de reencarnação. Estarão
certos os espíritas?
Na mesma época, havíamos
participado da criação do Núcleo Espírita Universitário do Fundão. Nele
incentivamos a formulação de perguntas. O critério foi “perguntar não ofende”.
Procuraríamos as
resposta e as ofereceríamos em outra reunião. Deu certo e “passamos recibo de
ignorância” em muitas oportunidades. Para evitar frustrações solicitávamos uma prorrogação
para trazer a solução, mesmo que a resposta fosse “não temos ainda solução”,
por enquanto. Respostas foram oferecidas. Vamos a algumas perguntas, como
exemplo.
Onde fica o espírito de
uma pessoa viva? Os espíritos sofrem? Existem curas espirituais e poderiam ser
avaliadas cientificamente? É normal que médiuns utilizem instrumentos
cirúrgicos? O que é a morte? Existe reencarnação, como provar? O que é ser
médium? Pasteur era médium? Por que não vemos comunicação de caboclos e
preto-velhos, nas reuniões espíritas? Astrologia: sim ou não? Você acredita em horóscopo?
Numa outra ocasião não
fiz perguntas mas advertência, severa, sobre a problemática da negligência, da
imprudência e da imperícia profissional. Mas, para isso foram necessários
muitos anos de experiência vivida e trabalho prático braçal. Socializamos quase
tudo em revistas e congressos. É uma equipe pequena, mas muito guerreira..
Microbiologia
in foco. Informativo SBM. Ano 3/2010.
As publicações e
comunicações, embora não tenham grande expressão acadêmica, são importantes
sobre o ponto de vista ético-pedagógico. Neles as perguntas não são explícitas,
mas as respostas são autorais, com 90% de transpiração..
Peço perdão pela
indicação musical “relaxante”. Sabemos que gosto não se discute. Mas, pergunto:
mesmo nesse caso poético “não tem solução”?