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  • segunda-feira, 21 de julho de 2014

    A COMUNICAÇÃO DOS ESPÍRITOS

                                   
                  

    jose.passini@gmail.com


    O profetismo é prática milenar, conforme se constata no verbete profeta, na Enciclopædia Britannica, na sua edição original. 

    Quando se fala em comunicação com os mortos, há dois pontos interessantes a serem observados: primeiro, há os que dizem ser tal prática condenada “pela palavra de Deus”, citando a proibição contida no Deteuronônio, cap. 18: 10 a 13. Em verdade, não se trata de “palavra de Deus”, mas de recomendação pertencente à legislação mosaica; segundo, é interessante atentar-se para o fato de que a proibição comprova efetivamente o intercâmbio com os mortos, pois se existiu a proibição é porque existia o fato. É de senso comum que uma legislação que regula ou proíbe algo sempre surge a posteriori, e não a priori, ou seja, é feita sempre sobre um fato já existente. Logo, se Moisés proibiu é porque existia.

    Deve ser lembrado que a proibição de Moisés visava a coibir o abuso daqueles que mantinham o intercâmbio, usando-o para fins frívolos ou para a solução de problemas pertencentes à esfera das decisões dos homens e não dos Espíritos. Diga-se, de passagem, que o Espiritismo – que não proíbe nada – desaconselha o intercâmbio mediúnico para esses mesmos fins, esclarecendo que Espíritos superiores não se envolvem nesses assuntos, tão ao agrado de Espíritos frívolos e desocupados.

    Há, também, aqueles que se baseiam na filosofia tomista, que afirma a imortalidade da alma, mas que esta não tem vida plena sem o corpo, considerando-o seu instrumento indispensável, a ser readquirido na ressurreição, para o julgamento final. Não se sabe como Tomás de Aquino explicaria o fato de dois Espíritos desencarnados, Moisés e Elias, sem corpo material, terem conversado com Jesus, na presença de Pedro, Tiago e João (Mat, 17: 10 a 13) 

    Não vamos invocar o testemunho de cientistas que pesquisaram o fenômeno mediúnico e produziram farto material bibliográfico a respeito. Argumentaremos exclusivamente dentro da Bíblia, na tradução de João Ferreira d’Almeida, da Sociedade Bíblica Britannica e Estrangeira, edição de 1937. Citamos o ano da publicação pelo fato de essa mesma tradução já ter sofrido algumas “atualizações”.

    No Velho Testamento, (I Sam, 28), sob o título “Consulta à pitonisa de Endor”, vemos uma autêntica comunicação do profeta Samuel, que fora, enquanto encarnado, conselheiro do rei Saul. Este, na iminência de uma batalha, ressentindo-se da ausência do seu conselheiro, que desencarnara, ordenou fosse procurada uma evocadora de espíritos. Aparece-lhe Samuel, que o aconselha a não entrar na batalha contra os filisteus, sob pena de morrerem ele e seus filhos. Saul, que não fora buscar conselho, mas apoio, sentindo-se desamparado, caiu desmaiado. Embora seriamente advertido, entrou na batalha, onde pereceu, juntamente com seus filhos.

    No Novo Testamento (At, 16: 9), há o relato de uma visita feita a Paulo, por um homem que, liberto do corpo físico pelo sono, comunicou-se com ele: “E Paulo teve de noite uma visão, em que se apresentou um varão da Macedônia, e lhe rogou, dizendo: Passa à Macedônia, e ajuda-nos.” Nos versículos seguintes, vê-se que Paulo foi atender o pedido, vez que encaminhou-se à Macedônia. 

    Em Atos (10: 30 a 32), está claramente relatada uma comunicação de um espírito desencarnado, diretamente dirigida a um homem, sem ao menos usar o corpo físico de um médium, conforme relato do centurião Cornélio a Pedro: “Há quatro dias estava eu em jejum até esta hora, orando em minha casa, à hora nona, e eis que diante de mim se apresentou um varão com vestes resplandescentes, e disse: Cornélio, a tua oração foi ouvida, e as tuas esmolas estão em memória diante de Deus. (...) e manda chamar Simão, que tem por sobrenome Pedro: este está em casa de Simão o curtidor, junto do mar, e ele, vindo, te falará.” 

    Pedro estava no terraço da casa de Simão o curtidor, quando chegou a comitiva que viera convidá-lo. No momento em que chegaram os enviados de Cornélio, Pedro recebe a seguinte orientação de um Espírito: “Levanta-te pois, e desce, e vai com eles, não duvidando; porque eu os enviei.” Essa comunicação foi oportuna porque Pedro não atenderia o chamado de um romano, pelo fato de os discípulos de Jesus acreditarem, até àquela época, que a mensagem de Jesus deveria ser divulgada somente entre os judeus.

    Outra comunicação de Espíritos se deu com as mulheres que foram preparar o corpo de Jesus para a sepultura, na manhã daquele memorável domingo: “E, entrando, não acharam o corpo do Senhor Jesus. E aconteceu que, estando elas perplexas a esse respeito, eis que pararam junto delas dois varões, com vestidos resplandescentes (...) lhes disseram: Por que buscais o vivente entre os mortos?” (Luc, 24: 3 a 5)

    É interessante notar que os Espíritos, em vários relatos no Novo Testamento, apareceram com vestes resplandescentes, talvez para que não ficassem dúvidas de que se tratava mesmo de espíritos desencarnados.

    A comunicação recebida pelo Centurião Cornélio também demonstra esse mesmo o cuidado observado pelo Espírito comunicante, conforme se depreende do relato do romano a Pedro, na passagem acima citada.

    O Apóstolo Paulo – a maior autoridade em assuntos mediúnicos nos tempos apostólicos – deixou instruções seguras a serem seguidas por aqueles que pretendessem estabelecer o intercâmbio, como se lê na sua Primeira Carta aos Coríntios: “Segui a caridade, e procurai com zelo os dons espirituais, mas principalmente o de profetizar.” (14: 1) Num trecho desse mesmo capítulo, que o tradutor intitula: “A necessidade de ordem no culto”, está perfeitamente caracterizada uma reunião mediúnica, para a qual Paulo dá orientação segura, no sentido de preservar a objetividade, precavendo-se contra o estrelismo dos médiuns: “E se alguém falar língua estranha, faça-se isso por dois, ou quando muito por três, e por sua vez, e haja intérprete.” (27) E, a fim de evitar o deslumbramento, deixa outra recomendação: “E falem dois ou três profetas e os outros analisem.” (29) No capítulo 12, descreve os vários tipos de mediunidade, como seja, a psicofônica, a de falar línguas estranhas, a de cura e até a intuitiva – a ser exercitada pelo dirigente da reunião mediúnica –, que ele intitula “o dom de discernir os espíritos”.

    Cumpre notar, também, que Jesus não disse uma palavra sequer no sentido de condenar a comunicação com os mortos, pois seria uma incoerência, diante do fato, citado acima, narrado por três Evangelistas (Mt, 17: 10 a 13; Mc, 9: 2 a 13; Lc, 9: 28 a 36), que se referem ao diálogo que Jesus manteve com dois desencarnados: Moisés e Elias, na presença de Pedro, Tiago e João.

    A Enciclopædia Britannica diz que profeta em Grego clássico quer dizer “aquele que, ao falar, não o faz pelos seus pensamentos, mas por uma revelação de fora. Cita Platão: “Não devem ser chamados profetas aqueles que simplesmente interpretam oráculos.

    Em verdade, em todo o Novo Testamento não há uma linha sequer condenando a comunicação com os mortos. A literatura existente nesse sentido provém das interpretações equivocadas de teólogos que veem os fatos como lhes convém.

    Além do mais, não há mortos, mas apenas Espíritos encarnados e desencarnados.





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