|
José Passini |
Ao tecermos estes comentários sobre
o livro “Fundação Emmanuel”, não nos move outro propósito além daquele de
promover uma discussão sadia, a fim de que possam ser esclarecidos pontos um
tanto obscuros e outros que não nos pareceram consentâneos com a Doutrina
codificada por Kardec, deixando claro que discutimos idéias e não pessoas.
Para maior facilidade e fidelidade,
transcreveremos os trechos em estudo em negrito,
seguindo-se os comentários em letra comum. Como os trechos já estão em negrito, não os colocamos entre aspas,
deixando-as para usar onde o Autor as usou.
— Então, – indaguei –, existem demônios?
— Não, na acepção da palavra... Deus
é único e, no final, a Luz há de prevalecer sempre. No entanto, devemos admitir
que, do ponto de vista intelectual, em seu aspecto avesso, existem espíritos
que se confrontam com o Cristo quase em seu nível.
— Quase em seu nível?
— Quase, Inácio... São espíritos tão
altamente intelectualizados, que não temos cabeça para conceber-lhes a
existência.
— E onde vivem? Nas adjacências do
Planeta?...
— Estão em toda parte, mas o seu habitat
preferencial é o interior do Orbe; enquanto o Senhor nos atrai para
cima, eles nos atraem para baixo... (26 - 27)
Sabe-se que a evolução do Cristo está
muitíssimo acima de qualquer outro Espírito que a Terra conheceu, logo, esses Espíritos voltados ao mal – que estão
próximos à evolução intelectual do Cristo – devem estar muitíssimo acima de
todas as grandes inteligências que já se encarnaram no Planeta.
— É, mas ele, Chico, não acreditava que
fosse a reencarnação do Codificador... (31)
Qual a utilidade de bater nessa
tecla desgastada, da reencarnação de Kardec? Que contribuição isso traz para o
esclarecimento e melhoria das pessoas?
— Em situações semelhantes, ele se viu
muitas vezes, Odilon; as propostas que o próprio Clero lhe fez ou lhe mandava
fazer, para que regressasse às suas origens, ou seja, ao seio da Santa Madre
Igreja...
— Inclusive, tentando-o com
dinheiro...
— Com muito dinheiro e prestígio,
prometendo custear os seus estudos na faculdade em que desejasse se matricular,
em Belo Horizonte e, ainda, lhe auxiliar a família. (35)
Em que essa afirmativa contribui
para a edificação do leitor? Onde os documentos ou testemunhas que possam
comprovar acusações tão graves? Por que
essas acusações contra a Igreja? Que benefício esse relato traz ao Movimento
Espírita?
— Aqueles sonetos perfeitos e de rara
inspiração e beleza, “escritos” por um rapazinho que calçou o seu primeiro par
de botinas com quase 15 de idade...
— Doado por um padre! – para mim, é
o único senão da história. Ora bolas, será que em Pedro Leopoldo não havia
ninguém que pudesse doar um par de botinas a um menino pobre? Tinha que ser um
padre!... (36)
O Dr. Inácio faz sempre questão de
mostrar a sua aversão à Igreja e aos padres. Em que essa “gracinha” contribui
para a difusão da nobre mensagem espírita? Qual a sua finalidade? Encher
páginas de livro?
As páginas mediúnicas em questão se inspiraram
no espírito de Allan Kardec, mas não foram evidentemente, inspiradas por ele.
— A mediunidade – comentei – tem
tantas nuances!...
— Muitas, Inácio, muitas nuances que
carecem ser levadas em consideração no estudo do fenômeno. (38)
É um tanto complicada essa questão
de se inspirar no Espírito de Kardec. Parece vontade de confundir as coisas. Se
um Espírito se inspirou nos ensinamentos de Kardec e fez com que a mensagem
fosse atribuída a ele, trata-se de mistificação. Se o médium se inspirou, e deu
a público como se fosse Kardec, foi animismo. Não se trata, portanto, de nuance
mediúnica.
— Exatamente. Os que correram os olhos mais detidamente sobre o livro
“Paulo e Estevão”...
— Uma obra prima da literatura
espiritualista!
— ... perceberão, na excelente
narrativa de Emmanuel, que Jesus, redivivo, toca diversas vezes a cabeça do
ex-doutor do Sinédrio, que, num átimo, se converte...
— A súbita conversão de Paulo sempre
intrigou! Ele não poderia se tornar um outro homem, apenas pela visão ao Cristo
Ressurecto... (39)
A referência não confere com o que
está no famoso livro de Emmanuel, que registra o seguinte: “o Mestre tocou-lhe
os ombros com infinita ternura, dizendo, com inflexão paternal: — Não
recalcitres contra os aguilhões!...”
Seria até irrelevante o fato de
haver equívoco na referência ao local do toque de Jesus, não fosse o aspecto milagroso atribuído ao acontecimento: Jesus,
redivivo, toca diversas vezes a cabeça do ex-doutor do Sinédrio, que, num
átimo, se converte.
Diante do relato, poder-se-ia
concluir que a conversão de Saulo não se deu por decisão própria, mas porque
fora ‘tocado pela graça’, o que contraria frontalmente os ensinamentos
espíritas. Não se nega o efeito benfazejo da presença do Mestre, mas a decisão
coube a Saulo, mesmo porque, seria de se perguntar por que Jesus não convertera
os soldados que o crucificaram.
— Sem a intervenção direta do Cristo, um
espírito não logra cumprir a missão que Chico Xavier cumpriu sobre a Terra.
– Ah! – exclamei, com sinceridade –,
como anelaria que Jesus me tocasse a cabeça com suas Divinas Mãos... (40)
Será que o Dr. Inácio está querendo
dizer que Chico Xavier foi “agraciado” com uma prerrogativa especial? Teria ele
sido escolhido para a missão, não pelos seus valores espirituais, mas pela
possibilidade de receber a intervenção direta do Cristo? O
Autor parece não fazer distinção entre intervenção de ajuda, de amparo e
interveniência no livre-arbítrio de um Espírito. Se o Mestre mudasse
milagrosamente as pessoas, teria mudado Pedro, que não o teria negado. Teria transformado
também a Judas, mas, um Espírito, quanto mais evoluído, tanto mais respeita o livre-arbítrio
do próximo.
— O personalismo campeia entre médiuns e
dirigentes...
— Necessitamos de rever a proposta
de Unificação; o homem ainda não sabe ocupar qualquer condição de liderança,
sem que o cargo lhe suba à cabeça.
(42)
Depois de atacar espíritas e médiuns
em outras obras, agora ataca a Unificação. Ataca essa realização gigantesca,
que não encontra similar no mundo. Unificação que foi conseguida exatamente porque
nela, o amor à causa superou as posições pessoais, graças à compreensão dos
abnegados espíritas que a ela se dedicaram e se dedicam com denodo, por amor à
Verdade. Esse Movimento sui generis causa admiração a todo aquele que o
observa, seja do ângulo teológico, seja do sociológico, como um fato inusitado
na História: Uma comunidade religiosa que se une em torno de uma Doutrina, em
âmbito nacional, sem que ninguém tenha autoridade religiosa ou poder decisório
sobre os demais. É a verdadeira realização da religião ensinada e exemplificada
pelo Cristo, que se concretiza através do Espiritismo.
— Os centros espíritas devem guardar a sua
independência; cooperar, sim, e sempre com toda iniciativa geral de caráter
doutrinário, mas não se submeterem...
— A situação é delicada, Inácio. Em
seu processo de hierarquização, foi que o Catolicismo começou a se perder. Em
nosso meio, a liderança deve ser espontânea. (42 - 43)
É de se perguntar a que vem esse
conselho extemporâneo aos centros espíritas, no sentido de não se submeterem.
Não se submeterem a que ou a quem? Novamente, a confusão intencional entre
esforço de unificação e processo de hierarquização.
Trata-se de um plano ardilosamente
preparado para desestruturar a Unificação do Espiritismo, que vem sendo
habilmente posto em prática, através de uma pregação baseada em pressupostos
falsos. Àquilo que os mal intencionados chamam processo de hierarquização, os
bem intencionados chamam de nobre esforço de trabalho conjunto.
— Os
espíritos que integram a Fundação “Emmanuel” sempre se comunicam, usando o seu
nome?
— Quando o médium lhes fornece
abertura e se liberta de qualquer fixação mental, no que tange à identidade do
comunicante, se lhes amplia o leque de possibilidades junto ao medianeiro.
— Quer dizer que a questão da
identidade do espírito comunicante...
— Está mais afeta ao médium do que
propriamente ao espírito, o qual, em última análise, se preocupa com a
transmissão de suas idéias. (85)
Realmente, aprende-se com Kardec que
não se deve valorizar uma mensagem pelo simples fato de ter sido assinada por
alguém de nome ilustre, mas sim pelo seu conteúdo. Mas, ficar ao arbítrio do médium o uso do nome de um Espírito
como Emmanuel...
— Por aqui também, Doutor, eles se
reproduzem...
— Os gatos?! – indaguei,
agradavelmente surpreso, olhando de soslaio para Odilon.
— Os gatos, os pássaros, as
flores...
— Esse assunto de reprodução, depois da morte, é um dos
que mais me
interessam – observei. — Quer dizer...
— ... que a Vida, em qualquer
dimensão em que se manifeste, prossegue inalterável, sublimando-se sempre. (97)
É interessante notar que o próprio
Dr. Inácio, no livro “Na próxima Dimensão” (214 - 215), relata que vira uma
espécie de rouxinol chocando, e, nesse momento, toma conhecimento do nascimento
de crianças no Mundo Espiritual (sic). Agora, neste livro, demonstra surpresa
ante a reprodução de gatos... Se essa reprodução fosse real, como o Dr. Inácio,
depois de dezoito anos no Mundo Espiritual, sendo diretor de um hospital, ainda
não soubesse disso?
Confesso-lhes que eu não conseguia tirar os
olhos do ventre daquela menina que me passou a inspirar enorme simpatia.
— O senhor quer tocar-lhe o abdômen,
Doutor? Érica não se importa e Gustavo não é ciumento.
Eu estava tão absorto e encantado,
que mal pude atinar com a espirituosa brincadeira de Ferdinando. Como se aquela
garota, que mais me parecia uma boneca falante de tão bela, fosse a filha que
eu nunca pude ter, apalpei-lhe carinhosamente o ventre e, pasmem, a criança deu
sinal de vida sob a minha mão... Os meus olhos se encheram de lágrimas e,
notando minha forte emoção, Érica, que conseguia ser menor do que eu, ficou na
ponta dos pés e me osculou a face.
— Você está realmente grávida
concluí e isso, minha filha, será um problema!
— Um problema para nós, isto é, para
mim e para o Gustavo?
— Não – respondi –; para os nossos
irmãos na Terra!... A turma por lá...
— Eu sei, Doutor, é
preconceituosa...
— Se fosse só uma questão de
preconceitos, a questão não seria tão grave assim. É mais sério, porque se
trata de ignorância mesmo! (98 - 99)
Quando André Luiz começou a fazer
aquelas revelações extraordinárias, principiando pelo livro “Nosso Lar”, não se
preocupou com a repercussão que a obra provocaria na Terra: tinha a segurança
própria dos que detêm a Verdade. O Dr. Inácio, repetidamente, manifesta sua
preocupação com o que os espíritas estão dizendo ou irão dizer daquilo que ele
revela... E tacha a todos aqueles que não aceitam as suas “revelações” de
preconceituosos e de ignorantes!
Quando, através de Chico Xavier,
André Luiz se referiu com palavras menos fraternas àqueles que não aceitaram de
imediato suas revelações?
— Para quando será a criança, minha
filha? – questionei.
— Dentro de uma semana, completarei
os cinco meses...
— Faltam três, para oito...
— Não, doutor, o nosso tempo de
gestação é menor – se passar da data, não será muito.
— E de onde vem esse menino? – criei
coragem e formulei a pergunta que mais me intrigava. Mas, antes que um dos
dois, ou o próprio Ferdinando, me respondesse, me virei para os amigos, que se
mantinham em silêncio, e reclamei: — Vocês vão me deixar sozinho nesta?... (100)
Será que o Dr. Inácio não sabe que
uma gestação normal dura nove e não oito meses? Através de seus livros,
pretende fazer revelações, mas será que essas novidades também são novas
na Colônia Espiritual onde estagia? Se isso fosse real, seria possível que ele,
diretor de hospital psiquiátrico, não soubesse – depois de dezoito anos de
desencarnado – de onde viriam os espíritos para essas encarnações espirituais?
— É o bisavô de Gustavo que está reencarnando – disse a jovem às
vésperas de ser mamãe. — Ele reside em Plano Espiritual mais elevado, e cremos
que, talvez, se não tivéssemos desencarnado, fosse estar conosco na Terra...
Muitos necessitam dele por aqui...
— Acreditamos, Doutor, que seu próximo passo
será mesmo voltar ao convívio de nossos familiares no mundo – observou o futuro
genitor.
— O espírito, quando pretende se
demorar em determinada dimensão espiritual, inferior à que esteja presentemente
habitando, necessita ganhar corpo – elucidou Ferdinando, resumindo: — Para
cima, ele tem que perder, para baixo, ele tem que ganhar... (100 - 101)
Importa notar que aqui fica claro
que um Espírito superior, para permanecer nessa colônia, deveria ganhar corpo, ou seja sofrer um
processo semelhante à reencarnação terrena. Logo, não passariam por esse
processo Espíritos inferiores.
—Quer dizer,
então, que aqui só nascem – ou renascem – espíritos de maior elevação?
— No plano em que estagiamos, ainda
não.
— Por favor, Ferdinando, seja mais
claro – solicitei.
— Não é tão simples traduzir isto em
palavras, porém vamos tentar. É que, além das dimensões espirituais que se nos
localizam acima e aquelas que se nos posicionam abaixo...
— O próprio Umbral, a Crosta, as
Trevas, o Abismo...
— Sim, além das mencionadas pelo
senhor, existem as dimensões paralelas... (100 – 101)
Há uma flagrante contradição nessa
pretensa revelação de encarnações
espirituais, pois agora não fala mais em dimensões acima, mas paralelas...
Essa gravidez no Mundo Espiritual, já revelada
na obra “Na Próxima Dimensão” é tão absurda que nem merece mais comentários.
Parece até que o Dr. Inácio está querendo testar o nível de conhecimento
doutrinário dos espíritas, para não dizer o nível de bom-senso.
— Estou aqui com um exemplar do “Resenha
Espírita da Crosta”, nas mãos...
— Como?! – interpelei, admirado.
— Um periódico espírita com notícias
da Terra e, em especial, do Movimento Espírita no Brasil.
— Impresso onde?
— Na “Fundação”... Circula
internamente.
— Um jornal espírita no Além, com
notícias do Aquém?...
— Do Aquém, Doutor, e do Mais Além! (124)
Lê-se exatamente o contrário dessa preocupação com
o que ocorre na Terra, conforme o diálogo entre André Luiz e Lísias:
“—
Mas não há recurso – indaguei – para recolher as emissões terrestres?
—
Sem dúvida que temos elementos para fazê-lo, em todos os Ministérios;
entretanto, no ambiente doméstico o problema da nossa atualidade é essencial. A
programação do serviço necessário, as notas da Espiritualidade Superior e os
ensinamentos elevados vivem, agora, para nós outros, muito acima de qualquer
cogitação terrestre.” (N. L., 127)
Em “Nosso Lar” não há interesse nem
em notícias familiares, mas na “Fundação” há até jornais que veiculam
falatórios terrestres...
— Dr. Inácio, por favor, uma derradeira
pergunta...
— Pois não.
— É verdade também o que o Resenha
está dizendo?...
— A menos que os jornais daqui
também se equivoquem como os da Crosta costumam se equivocar – respondi.
— “Aos espíritas que me criticam...”
– leu o rapaz, em voz alta.
— “...ofereço, solenemente, uma
banana!...” – não me esquivei de concluir, na alusão grotesca ao gesto feito
com a mão esquerda apoiar-se no braço direito, tendo o antebraço voltado para
cima com a mão fechada. (135)
O diálogo acima se deu no
encerramento de uma palestra que o Dr. Inácio teria proferido na “Fundação
Emmanuel”. No encerramento, o Dr. Odilon, ao lado de conceitos elevados, não
deixou de fazer uma defesa do Dr. Inácio, que logo depois foi protagonista,
diante de imensa platéia, da cena acima descrita, que dispensa comentários...
— Então...
— Mas – justifiquei – essa história
de eu oferecer banana aos espíritas é antiga, tão antiga, meu filho,
que, a estas alturas, já deve ter virado um cacho inteiro delas!
É evidente que, uma vez mais, o meu
propósito era o de provocar a descontração dos estagiários, que ficaram a
gargalhar enquanto nos retirávamos.
(136)
Será que o nobre orientador de Chico
Xavier, conhecido pela sua austeridade – não só pelas suas páginas, mas também
pelas informações do próprio médium – iria emprestar seu nome a uma Fundação onde fosse permitida a circulação
de jornais, revistas e panfletos que veiculariam conteúdos inaceitáveis até
mesmo em instituições terrestres? Esse tipo de imprensa e o nível do comentário
parecem mais consentâneos com o Umbral...
Antes que eu prossiga com detalhes do
diálogo que travamos, apenas a título de curiosidade, devo esclarecer que os
quinze participantes do grupo revelavam, inclusive, estreita semelhança fisionômica
com Emmanuel.
— O senhor deve estar imaginando –
disse-me Orígenes com espontaneidade –, como se o meu pensamento para ele se
desnudasse: — Emmanuéis em série, não é, Doutor?
— É!... – respondi, sem alternativa.
— O senhor sabe, naturalmente, que é
o pensamento que nos plasma a forma, não?
— Sim! –— É, então,
por esse motivo, Doutor – prosseguiu Orígenes –, que muitos sensitivos, além de
‘psicografarem’ Emmanuel, chegam a vê-lo.
— Estou...
— ... bestificado!
— Se o senhor parasse de ler os meus
pensamentos e de se apropriar de minha terminologia...
— ... eu agradeceria! – emendou,
desculpando-se em seguida:
— Não leve a mal; é involuntário... A Área em
que nos especializamos nos deixa de mente aguçada.
— Meu Deus, quantos Emmanuéis! –
exclamei.
— Estes são os originais...
— Acaso existem os falsos?!
— É claro que sim, e em maior
número. Por que o espanto, Doutor? O senhor, por ventura, acha que, em breve –
muito breve –, não haverão de aparecer outros Inácios Ferreiras operando mediunicamente?
— Tão falsos quanto o original! –
respondi, ainda um tanto aparvalhado.
— Segundo levantamento que fizemos,
só no Brasil, existem, presentemente, mais de cinqüenta médiuns ‘psicografando’
Emmanuel!...
— Outros tantos Andrés Luizes,
outros tantos Irmãos X, outros tantos Meimeis...
— Qual o seu nome, meu filho? –
continuei, aproximando-me de um jovem que, para mim, era a cara de Emmanuel, o
verdadeiro. O verdadeiro?! – perguntava, confuso, a mim mesmo. Que garantia possuía
, já que eu nunca estivera, face a face, com o original?!...
— Emmanuel! – respondeu-me o jovem
de belos traços romanos, a me glosar.
— Eu agora estou falando sério...
Por favor, você me poupe.
— O meu nome real não diria nada ao
senhor e nem para os nossos irmãos médiuns que me ‘recebem’...
— Mesmo assim, eu gostaria de saber
e, se possível...
— ... com carteira de identidade!
— Não! Todos aqui lêem pensamentos?!
— Doutor, o meu nome é Joaquim da
Silva.
— Um “Emmanuel” que é Joaquim!... E
os demais, como se chamam?
Um a um, foram se apresentando:
— Carlos José! Francisco dos Santos!
Luís Antônio! Marcus Vinicius! Pedro de Souza! Hermógenes Pereira! Luciano
Alvarenga!...
Os outros nomes, tão comuns quanto
os primeiros, poupar-me-ei de decliná-los, em protesto por não encontrar, entre
eles, nenhum Inácio.
— Mas, – comecei a questionar – como
entender-se, então...
— a diferença de estilo, Doutor, do
Emmanuel de “Chico Xavier”, dos “Emmanuéis” de outros médiuns? – completou
Orígenes. — O problema é que os
mensageiros, como o senhor está podendo constatar, estudam, já os médiuns, não.
— Ah, isso é verdade! – apressei-me
em concordar.
— De resto, no entanto, o que vale é
a essência do pensamento.
— Ainda que, do ponto de vista do
estilo, a mensagem deixe a desejar?
— A autenticidade doutrinária, ou
seja, o conteúdo é a característica mais importante. Ressaltemos, porém, que os
nossos mensageiros são todos instruídos no sentido de que auxiliem o médium a
se libertar e...
— a independer do nome que assume a autoria do
comunicado.
— O senhor aprende depressa, Doutor:
conseguiu ler o meu pensamento... Com um pouco de treino, daria um ótimo
“Emmanuel” (140 - 142)
Seria o caso do Doutor Inácio, coerentemente com o que
diz, não assinar seus livros. Para que identidade? Para quem conhece um pouco
da obra de Kardec e dos Espíritos equilibrados que se comunicaram através de
Francisco Cândido Xavier, de Yvonne do Amaral Pereira, de Divaldo Pereira
Franco, de José Raul Teixeira, seria necessário algum comentário sobre tudo o
que foi dito acima?
— (...) Outra constatação digna de
nota é o fato de que quase todos os artistas; em todas as épocas da Humanidade,
retratarem a Augusta Face do Senhor de maneira praticamente idêntica! Não se
sabe de ninguém que O tenha retratado ao seu tempo... (180)
Pelo contrário, é difícil encontrar-se alguém que
tenha sido retratado de maneira tão diversa quanto o Cristo!
“— Inácio, meu amigo – dizia
delicado cartão – , eu não me esqueci que amanhã, 15 de abril, seria o dia
de comemorarmos o seu aniversário. Com o meu carinho e a minha gratidão, Modesta”.
Logo abaixo, estava escrito:
“– P. S. – O nome dela é “Mimi”. Foi
atropelada ontem, quase em frente à sua antiga residência. Fiquei com muita
pena dela e me lembrei de você. Só tem uma particularidade e espero que você
não se importe: “Mimi” está grávida!...”
— Não, não é possível! – balbuciei,
sentando-me na cama e acariciando o pêlo sedoso da gata. (183)
Novamente, a gravidez no Mundo
Espiritual. Desta vez, com a agravante de não ter-se iniciado lá, mas na Terra...
—
Desembuche, Manoel, antes que eu continue dizendo e escrevendo o que não
devo...
—
Dr. Inácio – esclareceu –, quatro padres estão à sua espera...
— Quatro?!... Um só já seria muito! Que desejam? Me converter?
—
Estão pedindo permissão para uma visita ao Hospital, alegando que receberam
graves denúncias.
—
Era o que estava me faltando: os espíritas ortodoxos de um lado e os padres de
outro! Isto é um complô! Que denúncias?...
—
De que, contra a vontade deles, estamos mantendo católicos internados aqui...
—
E louco tem vontade, Manoel? Por que
não se entendem com o Carmelita?...
—
Insistem em falar com o senhor. Disseram inclusive, com base nas informações
que receberam, que mantemos um arcebispo em regime de internação
compulsória.
—
Certamente estão se referindo a A., que acolhemos por solicitação de sua
genitora.
—
Se o senhor não os atender, ameaçam denunciar-nos aos órgãos competentes;
voltarão com um mandado judicial...
—
Meu Deus!, isto aqui está parecendo a Terra ... E eu, que tinha esperanças de
que, após a morte, tudo se modificasse radicalmente!
(...)
—
Queremos que o senhor nos dê permissão para apurar certas denúncias.
—
Seja mais preciso – solicitei.
—
Sabemos que o hospital dirigido pelo senhor mantém aqui, contra a sua
vontade...
(...)
—
Trata-se, especificamente, de um arcebispo da Igreja... Poupe-nos uma ação
judicial: é verdade que ele está internado neste nosocômio? (186 – 189)
Deixamos de comentar os trechos acima, remetendo o
leitor à obra de André Luiz e de outros autores espirituais, que nos deram uma
visão muito diferente dos Planos Espirituais organizados no Bem.
Menino
e Stela vinham sendo tratados por nós há quase cinco anos e, quando foram
transferidos para o hospital sob nossa direção, o quadro que compunham não dá
para ser descrito, sem que nos arrisquemos a impressionar as mentes encarnadas
ainda um tanto despreparadas. A entidade feminina vivia, “literalmente”, no
estômago do seu algoz. (210)
Mais uma vez, o Dr. Inácio se
declara diretor do hospital...
Este é o caso de um apaixonado que
matou sua amada e devorou-lhe as vísceras. No Mundo Espiritual, a infeliz ainda
“vivia” dentro dele, sendo, mais tarde, necessário que ele a vomitasse.
—
Já está nascendo a criança? – Perguntei.
—
Quase.
Gustavo,
ao lado da mãe de seu primeiro filho, se mostrava naturalmente apreensivo.
Diligente
equipe médica se encontrava a postos, na expectativa do parto, o qual deveria
acontecer sem necessidade de qualquer intervenção instrumental.
(...)
—
Que aparelho é esse no braço dela?
(...)
—
É, então, um minicomputador...
—
Funciona como se fosse e é capaz de apontar, com precisão absoluta, desequilíbrios
de risco para o organismo.
—
Como, por exemplo, a iminência de um colapso cardíaco, alteração da pressão
sangüínea?
—
Taxas de glicose, oscilação de temperatura, presença de um microorganismo
patogênico... (226)
Essas, as possibilidades de um aparelho
que a “parturiente” trazia no braço... O que aconteceria se a “parturiente”
sofresse um ataque cardíaco? Uma hiperglicemia? Uma hipotermia? “Desencarnaria”?
Será que há necessidade de
comentários?
— Como aquele tripulante português – o senhor conhece esta? – que, tendo
subido à torre de observação da nau de Pedro Álvares Cabral, pôs-se a gritar em
desespero: — “Terra na vista! Terra na vista!...”
O Dr. Hernani, que sempre apreciou uma boa
anedota, gargalhou e perguntou:
—
E daí?...
—
Cabral lhe respondeu: — “Então, desça, infeliz, que o médico está no convés...”
—
Dr. Inácio, e no caso não havia jeito: o tripulante era português mesmo, não é?
Nem
o próprio Cairbar conseguiu conter o riso.
—
Mas – tomou Hernani a palavra –, o senhor sabe aquela do papagaio que era médium?...
—
A do papagaio português?
—
Não, este era baiano: morava num terreiro de macumba... Não sei se era papagaio
português reencarnado; o senhor sabe, a reencarnação torna tudo
possível...Quando a coisa começou, ou melhor, a sessão de terreiro teve início,
os médiuns incorporaram todos ao mesmo tempo e era só tamborete e tambor voando
para todos os lados... O papagaio, coitado, mal teve tempo de se abaixar, e um
tamborete quase lhe decepa o pescoço. — Currupaco! – disse ele no puleiro. —
Ainda bem que sou médium vidente,
pois, no caso contrário, teria desencarnado!... (241)
Depois de lermos as obras
edificantes de Emmanuel, temos de ler piadas de mau gosto num livro que leva o
seu nome... Onde localizar esse Espírito que, se intitula “Dr. Inácio”, na
“Escala Espírita”, que Kardec mostra em “O Livro dos Espíritos”, a partir do
item 100?
—
Meu caro Dr. Hernani – aparteou Odilon, aproveitando a deixa –, o senhor não
repare, se precisamos ir; temos ainda uma visita a ser feita hoje...
—
Que pena! – lamentou.
—
Voltaremos para uma nova sessão de piadas – enfatizei. — Tenho algumas para lhe
contar, mas só nós dois...
—
Picantes?
—
Piada espírita não tem graça, Hernani!
(241)
Será, ainda, necessário algum
comentário?
—
De que se trata? – questionei Odilon.
—
O sangue em sua roupa é conseqüência do seu condicionamento mental: todo ferido
sangra... Além das fraturas, ele deve ter tido hemorragias internas e,
certamente, foi o que ocasionou o seu desenlace.
—
E o líquido avermelhado que continua a lhe escorrer da fronte?
—
Inácio, você não ignora que em nossas veias
alguma coisa continua circulando, não é? O sangue é uma transubstanciação do
princípio vital. Para nós, o perispírito é um envoltório quase tão grosseiro
quanto o corpo feito de carne...
—
O perispírito “sangra”? (256)
Esse diálogo se dá ante a visão de
um jovem que desencarnara em um desastre automobilístico.
O que causa admiração é o fato de,
depois de dezoito anos no Mundo Espiritual, um médico, diretor de um hospital,
nada saber da anatomia do perispírito...
Esconjuro-vos,
ó adeptos da ortodoxia retrógrada de qualquer sistema religioso vigente no Planeta!...
Afastai-vos! Deixai “Mimi” parir em paz!... Que tendes contra o dom divino da
procriação em todas as dimensões? Por que somente vos supondes viris o bastante
para o ato de fecundar? O que vos leva a crer que sejamos, após a morte,
animais, dotados ou não de razão, anjos destituídos de orgasmo? Que Bastet, a
deusa egípcia dos gatos, à qual rendo culto em minha herança idolátrica, se
compadeça de vossas almas incrédulas e pecadoras!... Vós, que sequer sabeis
onde tendes o nariz, não queirais intrometer-vos no que não é da alçada senão
dos místicos e dos poetas. Se não vos considerais preparados para a Grande
Iniciação, estacai vossos passos no pórtico do templo da Verdade! Retrocedei, ó
vós que vos apegais à letra que mata –, mesmo que essa letra seja a da
Codificação Espírita – , e não ao espírito que vivifica. Deixai “Mimi” parir em
paz!... (270 – 271)
Como enquadrar esse Espírito e suas
comunicações em “O Livro dos Médiuns”?
Em “O Livro dos Espíritos” poder-se-ia classificá-lo nos itens 103 e
104, como Espírito leviano e
pseudo-sábio, respectivamente.
—
Quem se sente destituído de palavras, nesta hora, sou eu, o Chico que muitos de
vocês conheceram, e não o Allan Kardec, o apagado Professor de outras eras, que
nada mais fez do que compilar o ensino dos Bons Espíritos, e, como médium,
continuou a fazer o mesmo trabalho – o trabalho de simples intermediário, de
limitado intérprete do que os Espíritos Amigos escreveram por minhas mãos... (296)
As
palavras acima teriam sido proferidas durante um pronunciamento de Chico Xavier
na Fundação Emmanuel. Na sua infeliz tentativa de
provar que Chico Xavier foi a reencarnação de Allan Kardec, o Dr. Inácio, contando com o desconhecimento de muitos espíritas
a respeito da estatura intelectual do Codificador, coloca essas palavras
absurdas na boca do Chico, através das quais, exagerando a humildade dele,
desmerece a ambos, ao dizer que Allan
Kardec foi um apagado professor. Nega, assim, ao insigne Codificador a
condição de brilhante educador, de autor de planos educacionais que lhe valeram
premiações do governo de França, de autor de mais de uma dezenas de
obras referentes aos mais diversos campos do saber; de homem dotado de assombrosa
inteligência e de cultura geral extraordinária, colocando-o na condição de um
simples escriba, que teria desempenhado um papel inteiramente passivo, sem dar
nenhuma contribuição intelectual nem moral à codificação
do Espiritismo. Seria de se perguntar por que Jesus teria escolhido alguém com
tal capacidade (vide “Cartas e Crônicas”, cap. 28), para ser um simples
compilador dos ensinamentos dos Espíritos Superiores.
—
Quem me dera encerrar em mim tanta sabedoria e grandeza! Tenho vindo assim,
conforme sabem alguns, desde os tempos da Hélade, quando, igualmente, na
humilde condição de discípulo, registrei imperfeitamente para a Humanidade as
inesquecíveis lições do mais sábio de todos os filósofos... Perdoem-me a referência, que faço com o único
propósito de que os amigos me vejam como realmente sou, muito distante ainda da
posição em que me colocam. Tanto como Allan Kardec quanto como Chico Xavier, eu
poderia ter feito mais, se a minha condição humana o tivesse permitido! (296)
Prosseguindo
na sua tentativa de lançar a dúvida e a confusão no meio espírita, esse
Espírito ardiloso que se faz passar pelo Dr. Inácio Ferreira insinua que Chico
Xavier, além de ter sido Allan Kardec, foi também Platão, apequenando a figura do
eminente filósofo, colocando, também ele, na condição de simples anotador dos
ensinamentos de Sócrates. Além do mais, essa declaração: eu poderia ter feito mais, se a minha condição humana o tivesse permitido! é inteiramente absurda, diante do que se aprende na Doutrina Espírita,
pois o Espírito reencarna e vem dar seu testemunho no meio social que escolheu
ou que lhe foi destinado, o mesmo acontecendo com a vestimenta física de que
dispõe. Será que o Chico teria sonhado
em desempenhar sua missão fora da condição humana?
—
Muitos não aceitam que você é Kardec...
—
E qual o problema? Já fui, não sou mais... Agrada-me ser Chico Xavier, a
responsabilidade de ser médium é grande, mas é menor... Não é verdade, Odilon?
—
É claro, Chico!
—
Deus me livre de continuar sendo o Allan Kardec que querem que eu seja! E mesmo
do Francisco que fui sobrou só o cisco!...
—
Eu prefiro você como Chico – atrevi-me a dizer. Com o Codificador da Doutrina,
não poderíamos ter uma conversa tão informal assim... Seria um despropósito e,
para muita gente, uma heresia.
—
Foi por esse motivo que eu pedi que ficassem para conversar comigo: vocês me
conheceram como eu gosto de ser e como eu não quero deixar de ser! (316)
O Dr. Inácio, em quase todos os seus
livros, faz questão de abordar esse assunto, embora note, ele mesmo, que se
trata de duas personalidades diferentes. É de se perguntar, qual a relevância
desse assunto, ainda que fosse verdade? Revelação sem fundamento, de que nunca
se ocuparam os Espíritos Superiores.
Pela insistência com que é trazida à
baila, verifica-se que tal abordagem tem o fim exclusivo de causar confusão e
de distrair os espíritas, encaminhando-os a discussões estéreis, que só são
úteis àqueles que desejam desmerecer a Doutrina Espírita.
José
Passini
Juiz
de Fora MG
passinijose@yahoo.com.br