Adicionar legenda |
Depois da chamada aparição (“ressurreição”) e a “ascensão” de Jesus, os apóstolos retornaram a Jerusalém, exatamente como o Senhor lhes havia ordenado.[1] Deram início às reuniões em suas residências, e aos poucos os encontros foram se tornando públicos. Nessa conjuntura ainda não eram conhecidos como "cristãos", porém "nazarenos", dando início ao formato das comunidades (grupos) dentro do Judaísmo.[2] O célebre “pentecostes”, ocorrido logo após a “ascensão” do Mestre, veio fortificá-los na fé, cientificando a todos que o Cristo não os desamparara. Exaltando o Evangelho em diferentes idiomas pela psicofonia dos divinos médiuns, os Espíritos comprovavam que se cumpria naquele momento o prenúncio de Jesus de que sua mensagem seria ouvida por todas as nações da Terra.
Naquela ocasião, outro fato enternecedor adveio com Cléofas e outro discípulo que no domingo da “ressurreição” viajavam de Jerusalém para a aldeia próxima de Emaús, quando o próprio Crucificado se lhes ajuntou na caminhada. Posteriormente, Jesus apareceu por duas vezes totalmente materializado em Jerusalém nas reuniões realizadas em recinto fechado entre os apóstolos. Em seguida se apresentou na praia e comeu com alguns discípulos peixe assado e um favo de mel. Por cerca de quarenta dias após a “ressurreição”, continuou oferecendo provas inequívocas da imortalidade.
Nos supremos instantes os apóstolos reunidos oravam, cantavam, viviam e divulgavam o Evangelho, consubstanciando na fundação da “Casa do Caminho”, marco inicial daquela fase de ouro do Cristianismo primitivo. A recordação desses dois ou três primeiros anos do “pós-gólgota” ficou sendo como a de um paraíso terrestre, que o Cristianismo posterior jamais conseguiu reeditar.
Os apóstolos pregavam com arrebatamento a Boa Nova. As orações eram às vezes tão intensas que o próprio prédio “sacudia” em seus alicerces. A vida religiosa dos mesmos centrava em alguns desempenhos fundamentais: a oração, os sermões, a instrução religiosa e uma coletiva refeição diária. Levavam uma vida simples, despojada, sem confiar no poder do dinheiro. Em razão disso não se deixavam corromper.
Sem dúvida, as grandes colunas ou desígnios da “Casa do Caminho” foram: o ensino e vivência da mensagem de Jesus, a assistência social, os tratamentos físico e espiritual, e a instauração de ambiente fraterno. Empregavam o trabalho assistencial de distribuição de alimentos, de remédios, de roupas e até mesmo dos dons curativos como chamariz para conseguirem o objetivo maior: a evangelização do socorrido. Procuravam transformar o assistido em assistente tal como aconteceu com Jeziel, que veio a ser o admirável Estevão, primeiro mártir do Cristianismo.
Não cobiçavam cargos de comando. Certa vez, Pedro, o primeiro líder do grupo, deliberou escolher um sucessor para Judas Iscariotes no colégio apostólico. Reuniu uma assembleia para eleger o sucessor. A assembleia apresentou dois nomes: José Justo e Matias (dois fidedignos cristãos). Sugeriu-se então, em vez de eleição, depositar os dois nomes numa sacola e retirar um após uma prece. Desse modo Matias foi o escolhido para suceder a Judas Iscariotes. A comunidade vivia um momento tão fraternal que José Justo, embora não tenha sido escolhido pelo sorteio, ofertou sua propriedade à “Casa do Caminho”, em sinal de solidariedade à decisão tomada pelo Plano Superior.
Simão Pedro e companheiros administraram a “Casa do Caminho”, situada na estrada que ligava Jerusalém a Jope. Auxiliado particularmente por Tiago (filho de Alfeu) , Filipe e por João (filho de Zebedeu), Cefas organizou os primeiros arranjos da instituição ao influxo amoroso das lições do Mestre. Em face disso, a residência do velho pescador (doação dos amigos do "Caminho"), transbordava de enfermos e desvalidos sem esperança. É célebre a frase do Cristo "Eu sou o caminho, a verdade e a vida". Em face dessa citação, quando os discípulos assumiram a divulgação do Evangelho, passaram a ser conhecidos como os “homens do Caminho".
O número de seguidores da nova Doutrina aumentou espantosamente – além dos discípulos judeus-palestinenses havia discípulos da diáspora, apontados como "helenistas". Nesse contexto em que a “Casa do Caminho” crescia, paralelamente ocorriam os rigores do misticismo de Tiago, filho de Alfeu. Irromperam as diferenças de opiniões e de interesse entre os discípulos judeus-palestinenses e os “helenistas”. Os apóstolos, sentindo a necessidade de se dedicarem só à pregação, providenciaram para que a comunidade escolhesse trabalhadores fiéis para instruir os judeus da diáspora ( “helenistas”).[3]
Destaca-se na ocasião o “helenista” Estêvão, um judeu da diáspora, que aderiu à "Seita do Caminho" e começou a fazer em Jerusalém pregações veementes acusando os judeus de massacrarem os Profetas e Jesus, além de críticas à Lei e ao Templo. Talvez fosse ele o porta-voz da mais antiga pregação dos discípulos convertidos provindos da diáspora.
O irmão de Abigail analisava as profecias, sobretudo de Isaias. Ao saber que Jesus havia sido crucificado, recordou o profeta: “Levantar-se-á como um arbusto verde, vivendo na ingratidão de um solo árido, onde não haverá graça nem beleza. Carregado de opróbrios e desprezado dos homens, todos lhe voltarão o rosto. Coberto de ignomínias, não merecerá consideração. É que Ele carregará o fardo pesado de nossas culpas e de nossos sofrimentos, tomando sobre si todas as nossas dores.”[4]
Quando outros seguidores do Mestre contemporizavam os comentários públicos com exposições agradáveis ao judaísmo predominante, “Estevão apresentava à multidão o Salvador do Mundo, indiferente às lutas que iria provocar, comentando sobre a vida do Crucificado com o seu verbo inflamado de luz.”[5]
O idioma grego foi o veículo de transmissão do Cristianismo nos seus primeiros tempos. Mais tarde Paulo pregou que não havia diferença entre "judeu" (palestinenses) e "grego" (“helenistas”) quanto à “salvação” em Jesus Cristo, porque pelo "batismo do Espírito", ou seja, imposição de mãos pelo passe, todos se tornavam "irmãos em Cristo"; portanto não era preciso passar antes pelo judaísmo para se tornar cristão. Mas tal questão só ficou definitivamente resolvida após uma reunião com os apóstolos e os anciãos (presbíteros) na comunidade (igreja) de Jerusalém, em 49 d.C. A essa reunião alguns estudiosos chamam de "Concílio" de Jerusalém. [6]
Fazemos aqui uma breve interpolação por questão de coerência histórica. Em nossa narrativa não podemos esquecer que a primeira dessas congregações cristãs surgiu na Galileia, e era composta principalmente de mulheres oprimidas e simples do povo. Tais baluartes do Evangelho atendiam os mendigos, pedintes, coxos e aleijados com auxílios de amparo e de solidariedade. Na crise do Calvário, que culminou na morte de Jesus, as mulheres galileias tiveram posição destacada aos pés da Cruz. A “Casa do Caminho” contou com a colaboração fundamental de valorosas companheiras de ideal. Maria (mãe de Jesus), Lídia (mãe de Silas), Maria e sua irmã Marta, Suzana, Salomé, Maria [esposa de Cléofas], Maria (mãe de João Marcos), Maria de Magdala, Joana de Cusa, Loíde e Eunice ( avó e mãe de Timóteo), Priscila (esposa de Áquila), Lídia, viúva digna e generosa etc, etc, etc...
Mais de cem pessoas recebiam assistencialmente alimentação diária, além dos serviços de socorro aos enfermos, aos órfãos, aos alienados mentais e viciados. Por outro lado, a perseguição atroz do judaísmo obrigou a uma relação de permanentes concessões. Havia infelizmente a dependência monetária da sociedade judia para manutenção da obra.
Certa ocasião, Paulo, já convertido, quando em visita a Jerusalém, consternado com a situação da “Casa do Caminho”, em diálogo com Pedro, recomendou buscarem-se outros meios de libertar as verdades evangélicas do convencionalismo humano. Sugeriu serviços agrários de captação de recursos próprios. Cada assistido trabalharia de conformidade com as próprias forças. Assim poderia emancipar o grupo de Jerusalém das imposições do farisaísmo.
Pedro justificava que os assistidos já trabalhavam, contudo a igreja continuava onerada de despesas e dívidas que só a cooperação do judaísmo poderia atenuar. Paulo advertiu, porém, que se poderia atender a muitos doentes, ofertar um leito de repouso aos mais infelizes; todavia sempre houve e haverá corpos enfermos e cansados na Terra. Na tarefa cristã, obviamente semelhante esforço não pode ser esquecido, mas a iluminação do espírito deve ser tarefa prioritária. Se o homem trouxesse o Cristo no íntimo, o quadro das necessidades seria completamente modificado.
Não mais de três séculos decorridos dos tempos apostólicos surgiram a falsidade e a má fé, adaptando-se às conveniências dos poderes políticos do mundo, desvirtuando-se todos os princípios, por favorecer doutrinas de violência oficializada. Por isso, a civilização ocidental não chegou a se cristianizar. [7] Mas o Espiritismo, na sua missão de Consolador, será o amparo do mundo nestes séculos de declives da sua História; só ele pode, na sua feição de Cristianismo redivivo, salvar as religiões que se apagam entre os choques da força e da ambição, do egoísmo e do domínio, apontando ao homem os seus verdadeiros caminhos. [8]
São chegados os tempos em que as forças do mal serão compelidas a abandonar as suas derradeiras posições de domínio nos ambientes terrestres. Trabalhemos por Jesus, ainda que a nossa oficina esteja localizada no deserto das consciências. [9]
Nota e referências bibliográficas:
[1] Lc 24:52; Atos 1: 12-13).
[2] Os discípulos do Crucificado foram chamados "cristãos" pela primeira vez na comunidade de Antioquia, na Síria; por sugestão de Lucas
[3] Atos 6
[4] Isaías, 9:6-7
[5] Xavier, Francisco Cândido. Paulo e Estêvão, ditado pelo espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB, 1982
[6] Atos 15:1
[7] Xavier, Francisco Cândido. A Caminho da Luz, ditado pelo Espirito Emmanuel, RJ: Ed. FEB, 1997
[8] idem
[9] idem
Nenhum comentário:
Postar um comentário